Opinião - A candidata Marina Silva
O Estado de S. Paulo - 12/08/2009
Marcos Sá Corrêa
A candidatura da ministra Marina Silva é o primeiro assunto sério da eleição presidencial. Ela não resolve as dúvidas sobre o próximo governo. Mas desarruma uma campanha que, como está, só serve para levar o País ao ridículo. Sem Marina Silva, os governadores José Serra e Aécio Neves poderiam atuar indefinidamente como se disputassem uma vaga nos suplementos dominicais que cobrem, com mais conhecimento de causa, problemas íntimos de relacionamento ou crises vocacionais. Alguém sabe qual foi a última notícia sobre a plataforma de Aécio, por exemplo? Tratava da prancha de surfe que ele acaba de adquirir.
Com a senadora no páreo, a ministra Dilma Rousseff provavelmente mudará de estilo, o que levaria todo mundo nessa história a ser mais sério. Marina Silva, de cara limpa, torna a maquiagem de Dilma mais pesada que seu currículo, onde os títulos de mestranda, doutoranda e candidata à presidência saíram da usina de factoides que oficializou no Planalto o "se colar, colou".
A senadora, ao contrário, tem um currículo que só fez encolher nos cinco anos e meio que ela passou no Ministério do Meio Ambiente, trabalhando com um presidente que considera toda conversa de meio ambiente uma solene besteira - e de besteira ninguém como ele entende. O resto da equipe aprendeu com Lula a tratar o ministério com amigável indiferença. Ou, no caso de Dilma, com franca hostilidade.
Marina Silva errou bastante, e não foi só por ficar no cargo mais tempo do que deveria. Ela apostou demais em reservas extrativistas e em assentamentos sustentáveis, que fariam bonito na Agricultura ou em qualquer programa social do governo. Mas, no Ministério do Meio Ambiente, condenaram os parques nacionais à penúria. Na equipe de Lula, ela acabou se prestando ao papel de disfarçar os estragos cometidos aqui dentro para uma opinião pública internacional que, lá fora, ouviu que era ela "a mulher que pode salvar a Amazônia" - como publicou no ano passado, pouco antes de sua demissão, o jornal inglês The Guardian.
Marina Silva recuou demais, perdeu embates decisivos, sobretudo com a ministra das Minas e Energia e, depois, da Casa Civil. Mas entrou e saiu do governo Lula caminhando em linha reta. E esse é um trunfo cada vez mais raro na órbita do presidente, que geralmente desmoraliza vencedores e vencidos com a mesma indiferença.
Contra o currículo falsificado de Dilma Rousseff, o que Marina Silva tem de forte é a biografia. E sua biografia tem tudo a ganhar com a candidatura, exceto - como tudo indica - a presidência da República. Repararia o dano que causou a si mesma, domesticando as ONGs ambientalistas com contratos no ministério. Oficializando-as, silenciou-as. E caladas elas continuaram quando a ministra se demitiu. Botando a campanha nas ruas, Marina Silva daria às ONGs uma oportunidade para sair dos gabinetes, aprendendo o caminho de volta aos protestos e à oposição.
Mostraria que, de onde menos se espera - o Senado -, ainda pode sair uma surpresa limpa e inatacável, o que, nas circunstâncias, em si despolui um pouco a democracia brasileira. Provaria que, mesmo com 80% de aprovação, o governo pode ter outro lado sim, inclusive lá dentro. Sobretudo, ofereceria aos brasileiros a chance de ouvir, pela primeira vez em eleição nacional, candidatos discutindo, queiram ou não, sua política de meio ambiente - porque sem isso não há mais governo no mundo que se leve a sério. Ela é o que faltava nessa eleição para o Brasil escolher outro presidente.
Comentário do Blog
A despeito da avaliação que se faz acerca da linha editorial do jornal O Estado de São Paulo e seu conhecido viés conservador, talvez o mais autêntico do jornalismo brasileiro, não mais sob a batuta da família Mesquita, mas de um dos mais poderosos bancos brasileiros, o editorial assinado pelo veterano jornalista Marcos Sá Corrêa, merece leitura pela forma objetiva e racional que trata da possível candidatura da senadora Marina Silva - ou Maria Osmarina, nome de batismo com o qual eu a conhecí na militância do clandestino PRC, no início dos anos oitenta, e que ingressou no território da política - à Presidência da República pelo indefectível Partido Verde.
A principal contribuição do editoral para o bem da racionalidade política é desmistificar a corriqueira intençâo de tornar a senadora vítima de todo um processo político ao qual "inadvertidamente" foi envolvida - a frágil aparência e saúde da ex-ministra contribui para a consolidação de tal imagem junto ao distinto público -, e de justiceira, que incorpora com sua eventual candidatura, a luta pela redenção dos erros cometidos no trato a questão ambiental ao longo dos oito anos de governo Lula ainda não completados.
Um governo no qual ela ocupou o Ministério do Meio Ambiente por quase sete anos, cujas escolhas de ações públicas para o setor nem sempre foram efetivadas à revelia da então ministra. Exageros desnecessários e até desrespeitosos de Lula e de alguns ministros a parte, ao se referirem à algunas posições defendidas por Marina, é, no mínimo, estranho ela ter demorado tanto a perceber que estava "no governo errado".
De comum com a trajetória de Heloísa Helena, a ação política movida pelo ressentimento e pelo messianismo de viés religioso.
O Estado de S. Paulo - 12/08/2009
Marcos Sá Corrêa
A candidatura da ministra Marina Silva é o primeiro assunto sério da eleição presidencial. Ela não resolve as dúvidas sobre o próximo governo. Mas desarruma uma campanha que, como está, só serve para levar o País ao ridículo. Sem Marina Silva, os governadores José Serra e Aécio Neves poderiam atuar indefinidamente como se disputassem uma vaga nos suplementos dominicais que cobrem, com mais conhecimento de causa, problemas íntimos de relacionamento ou crises vocacionais. Alguém sabe qual foi a última notícia sobre a plataforma de Aécio, por exemplo? Tratava da prancha de surfe que ele acaba de adquirir.
Com a senadora no páreo, a ministra Dilma Rousseff provavelmente mudará de estilo, o que levaria todo mundo nessa história a ser mais sério. Marina Silva, de cara limpa, torna a maquiagem de Dilma mais pesada que seu currículo, onde os títulos de mestranda, doutoranda e candidata à presidência saíram da usina de factoides que oficializou no Planalto o "se colar, colou".
A senadora, ao contrário, tem um currículo que só fez encolher nos cinco anos e meio que ela passou no Ministério do Meio Ambiente, trabalhando com um presidente que considera toda conversa de meio ambiente uma solene besteira - e de besteira ninguém como ele entende. O resto da equipe aprendeu com Lula a tratar o ministério com amigável indiferença. Ou, no caso de Dilma, com franca hostilidade.
Marina Silva errou bastante, e não foi só por ficar no cargo mais tempo do que deveria. Ela apostou demais em reservas extrativistas e em assentamentos sustentáveis, que fariam bonito na Agricultura ou em qualquer programa social do governo. Mas, no Ministério do Meio Ambiente, condenaram os parques nacionais à penúria. Na equipe de Lula, ela acabou se prestando ao papel de disfarçar os estragos cometidos aqui dentro para uma opinião pública internacional que, lá fora, ouviu que era ela "a mulher que pode salvar a Amazônia" - como publicou no ano passado, pouco antes de sua demissão, o jornal inglês The Guardian.
Marina Silva recuou demais, perdeu embates decisivos, sobretudo com a ministra das Minas e Energia e, depois, da Casa Civil. Mas entrou e saiu do governo Lula caminhando em linha reta. E esse é um trunfo cada vez mais raro na órbita do presidente, que geralmente desmoraliza vencedores e vencidos com a mesma indiferença.
Contra o currículo falsificado de Dilma Rousseff, o que Marina Silva tem de forte é a biografia. E sua biografia tem tudo a ganhar com a candidatura, exceto - como tudo indica - a presidência da República. Repararia o dano que causou a si mesma, domesticando as ONGs ambientalistas com contratos no ministério. Oficializando-as, silenciou-as. E caladas elas continuaram quando a ministra se demitiu. Botando a campanha nas ruas, Marina Silva daria às ONGs uma oportunidade para sair dos gabinetes, aprendendo o caminho de volta aos protestos e à oposição.
Mostraria que, de onde menos se espera - o Senado -, ainda pode sair uma surpresa limpa e inatacável, o que, nas circunstâncias, em si despolui um pouco a democracia brasileira. Provaria que, mesmo com 80% de aprovação, o governo pode ter outro lado sim, inclusive lá dentro. Sobretudo, ofereceria aos brasileiros a chance de ouvir, pela primeira vez em eleição nacional, candidatos discutindo, queiram ou não, sua política de meio ambiente - porque sem isso não há mais governo no mundo que se leve a sério. Ela é o que faltava nessa eleição para o Brasil escolher outro presidente.
Comentário do Blog
A despeito da avaliação que se faz acerca da linha editorial do jornal O Estado de São Paulo e seu conhecido viés conservador, talvez o mais autêntico do jornalismo brasileiro, não mais sob a batuta da família Mesquita, mas de um dos mais poderosos bancos brasileiros, o editorial assinado pelo veterano jornalista Marcos Sá Corrêa, merece leitura pela forma objetiva e racional que trata da possível candidatura da senadora Marina Silva - ou Maria Osmarina, nome de batismo com o qual eu a conhecí na militância do clandestino PRC, no início dos anos oitenta, e que ingressou no território da política - à Presidência da República pelo indefectível Partido Verde.
A principal contribuição do editoral para o bem da racionalidade política é desmistificar a corriqueira intençâo de tornar a senadora vítima de todo um processo político ao qual "inadvertidamente" foi envolvida - a frágil aparência e saúde da ex-ministra contribui para a consolidação de tal imagem junto ao distinto público -, e de justiceira, que incorpora com sua eventual candidatura, a luta pela redenção dos erros cometidos no trato a questão ambiental ao longo dos oito anos de governo Lula ainda não completados.
Um governo no qual ela ocupou o Ministério do Meio Ambiente por quase sete anos, cujas escolhas de ações públicas para o setor nem sempre foram efetivadas à revelia da então ministra. Exageros desnecessários e até desrespeitosos de Lula e de alguns ministros a parte, ao se referirem à algunas posições defendidas por Marina, é, no mínimo, estranho ela ter demorado tanto a perceber que estava "no governo errado".
De comum com a trajetória de Heloísa Helena, a ação política movida pelo ressentimento e pelo messianismo de viés religioso.
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