sexta-feira, 24 de junho de 2011

ENTREVISTA COM PRESIDENTE DO BNDES

Luciano Coutinho e os rumos da economia

Do Valor

Transição "difícil" vai demorar de 1,5 a 2 anos, diz Coutinho

Cristiano Romero | De Brasília
24/06/2011

O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, prevê um período "difícil", com duração de um 1,5 a dois anos, para a economia brasileira, especialmente a indústria, que está pressionada por uma conjuntura internacional adversa. A Europa, acredita ele, flerta com o desastre e a economia americana, a maior do mundo, ainda patina em seu processo de recuperação.

Para se sair bem desse período de transição, o Brasil, defende Coutinho, precisa enfrentar os seguintes desafios: moderar o crescimento da economia; controlar as expectativas de inflação; não desarmar o ciclo de investimentos previsto; criar as condições para que o financiamento privado cresça; atrair capitais e ao mesmo tempo estimular o aumento da poupança doméstica; evitar "estragos profundos" na estrutura industrial, pressionada pelo próprio "sucesso" do país e pela conjuntura internacional.

"É um conjunto de desafios muito grandes", disse Coutinho nesta entrevista ao Valor. Na semana passada, ele participou do XV Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo, que tenta se firmar como principal foro de debate econômico das economias que integram os Brics. Lá, ouviu relatos bastante pessimistas sobre a crise nas economias periféricas da Europa.

Coutinho revelou que, durante o fórum, do qual participaram os presidentes da Rússia, Dmitri Medvedev, e da China, Hu Jintao, além do premiê espanhol, José Luis Zapatero, foi feita uma enquete sobre a probabilidade de "default" no continente. A maioria dos participantes (53%), entre empresários e executivos de grandes empresas, previu que, nos próximos dois anos, pode haver calote na dívida em até três países da região. O restante previu que isso ocorrerá em mais de três.

"Este é um sintoma do grande ceticismo que prevalece lá. A discussão é se a crise pega a Grécia, Irlanda e Portugal ou se pega esses três e a Espanha também, embora a Espanha esteja mais protegida", comentou o presidente do BNDES.

Coutinho informou que o governo brasileiro trabalha na elaboração de uma nova política industrial com um olhar nesse contexto, em que a indústria nacional perde competitividade em função de um menor crescimento dos países ricos, destino original das exportações brasileiras, e também da apreciação do real frente ao dólar. Um dos setores a serem beneficiados pela política é o de produção de bens de capital (máquinas e equipamentos). A ideia é ajudar os setores exportadores em geral.

O presidente do BNDES observou, no entanto, que o espaço fiscal para apoiar a indústria neste momento é reduzido. Disse também que não há espaço para medidas radicais de controle de capital, que possam depreciar a taxa de câmbio. "Na verdade, o raio de manobra não é grande e o governo tem que, dentro do espaço que possui, otimizar, fazer aquilo que possa ser o mais eficiente possível e mais consistente com nossos objetivos macroeconômicos", assinalou.

Depois da Rússia, Coutinho esteve no Japão, para debater, no JBIC (Japan Bank for International Cooperation), oportunidades de investimentos no Brasil.

Valor: Por que o governo prepara uma nova política industrial?

Luciano Coutinho: A política industrial anterior foi anunciada em maio de 2008, com um vento a favor, a economia mundial e as exportações crescendo, mas logo em seguida veio a crise internacional, que mudou completamente a agenda.

Valor: O que mudou?

Coutinho: A agenda passou a ser a de recuperação do investimento. Em 2009 e 2010, o objetivo foi expandir o crédito, suprindo a forte contração do crédito privado. Isso foi bem-sucedido. A conjuntura atual é totalmente inusitada.

Valor: Por quê?

Coutinho: O mundo desenvolvido está em recessão, o que fez com que os preços das nossas exportações sofressem com mercados deprimidos nos países desenvolvidos, e a recuperação mundial está acontecendo só nos países em desenvolvimento, especialmente na Ásia, com a China, mas também com a Índia e outras economias, e aqui na América Latina, com o Brasil, que teve crescimento bastante expressivo no ano passado [7,5%]. Esse é um contexto inusitado também porque as moedas-reserva - o dólar e o euro - estão competindo uma com a outra para ver quem se deprecia mais. O dólar, pela política de super liquidez. E o euro, com as dificuldades das economias da periferia europeia, também está sob pressão. Há uma única exceção.

Valor: Qual?

Coutinho: A Alemanha, que está numa situação confortável. É uma grande exportadora de bens de capital (máquinas e equipamentos). É a única das grandes economias desenvolvidas que está bem. Já é uma economia industrialmente competitiva, exporta bens de capital para a China e tem um câmbio favorável. Mas a situação da Europa como um todo é precária.

Valor: Por causa da Grécia?

Coutinho: Sim, a crise grega é muito preocupante. Há um ambiente na Europa de total ceticismo com relação à capacidade de a Grécia cumprir o programa de ajuste. Começa a se formar a opinião de que, para cumprir o programa do Fundo Monetário Internacional (FMI), a Grécia teria que reescalonar de forma bem mais profunda a dívida, e isso bateria nos bancos europeus, que detêm algo como € 200 bilhões em dívida grega, então, há resistência a fazer isso. Por outro lado, não há saída.

Valor: Não haveria uma alternativa?

Coutinho: Numa visão mais extrema, há quem acredite que a Grécia teria que sair do euro para poder depreciar a moeda e ter flexibilidade cambial. Lamento ter deixado de ser professor de Economia Internacional porque isso era algo que eu estava antevendo lá atrás...

Valor: O quê, exatamente?

Coutinho: Essas economias todas, na hora em que entraram no euro, o fizeram com taxa de câmbio muito apreciada. Isso transmitiu para as sociedades uma sensação ilusória de riqueza. Ao mesmo tempo, ao adotarem a moeda comum, desapareceu o componente de risco de câmbio que sempre está embutido nas taxas de juros locais. Com o euro, o risco de câmbio desapareceu e os juros, automaticamente, passaram a ser mais baixos. Aquelas economias, que, digamos assim, nunca tiveram um juro alemão, passaram a operar com um padrão de juros muito mais baixo. Combinou-se uma falsa sensação de riqueza com uma taxa de juros baixa.

Valor: Quais foram as consequências disso?

Coutinho: Isso levou a um ciclo muito pesado de endividamento familiar e das empresas, à formação de bolhas imobiliárias e a déficits externos elevadíssimos. Essa situação da Grécia, de Portugal, da Irlanda, um pouco da Espanha, é preocupante. A Europa está flertando com o desastre. E há resistência a fazer um ajuste mais profundo.

Valor: O problema central da economia mundial está, então, na Europa?

Coutinho: Nos Estados Unidos, a economia ainda patina. O [presidente Barack] Obama está debilitado, com baixa popularidade, e os republicanos estão se vingando, de forma injusta, porque eles é que fizeram as guerras e destruíram as contas fiscais. Agora, estão exigindo compromissos fiscais violentos. Além disso, estão brincando com o desastre ao chantagear o governo, dizendo que não aprovarão a elevação do teto da dívida. O governo Obama tem que corrigir isso até o dia 1º de agosto para não dar um calote na dívida. Nesse contexto, há um contraste com a China e com o resto das economias em desenvolvimento, que produziram e realizaram a recuperação mundial. O problema é que essa recuperação foi muito desequilibrada.

Valor: Por quê?

Coutinho: Porque os países em desenvolvimento puxaram o crescimento mundial num contexto de excesso de liquidez. A combinação das duas coisas provocou o aumento dos preços das commodities e, agora, os países em desenvolvimento têm que desacelerar para controlar a inflação. Mas essa desaceleração não pode ser forte demais porque, senão, o mundo vai para uma recessão. É o que o Brasil está tentando fazer, ou seja, moderar o ritmo de crescimento, mas sem pisar no freio porque seria ruim para o mundo inteiro.

Valor: Essa moderação pode durar quanto tempo?

Coutinho: Vamos passar por um período difícil nos próximos 1,5 a dois anos, até esse quadro mudar. Até termos uma crescimento mais equilibrado na economia mundial, nossa indústria estará sob pressão muito forte. Exportação prejudicada pelo fraco crescimento dos mercados de destino originais do Brasil, embora o país esteja agora tentando diversificar as exportações cada vez mais para economias em desenvolvimento; e, de outro lado, o próprio sucesso do Brasil apreciou a taxa de câmbio e a gente não tem muita margem para mexer nisso. É um período difícil. A política industrial tem que se voltar para fazer a travessia desse contexto.

Valor: O que o governo pretende com a nova política?

Coutinho: O que estamos fazendo é buscar reforçar a competitividade da indústria através de uma série de medidas.

Valor: Que medidas?

Coutinho: Infelizmente, não posso adiantar porque estamos ainda numa agenda de discussão.

Valor: O FMI concluiu que, além do efeito da política monetária expansionista dos países ricos, o Brasil sofre com o fato de ter uma conta de capital mais aberta que a dos países asiáticos. Isso ajuda a apreciar ainda mais o real. Não há como enfrentar esse problema?

Coutinho: Não há espaço para medidas radicais, para instalar um controle de capital violento, que deprecie o câmbio. Também não dá para fazer medidas de natureza fiscal muito fortes. Na verdade, o raio de manobra não é grande e o governo tem que, dentro do espaço que possui, numa discussão que está em curso, otimizar, fazer aquilo que possa ser o mais eficiente possível e mais consistente com nossos objetivos macroeconômicos. É uma discussão complexa. Devemos focar nos setores onde está havendo mais pressão.

Valor: Quais são?

Coutinho: O de bens de capital é um deles, mas não é o único. Os setores de "tradables" (produtos comercializáveis com o exterior) em geral.

Valor: São medidas de efeito imediato ou para melhorar a competitividade de longo prazo da indústria?

Coutinho: O problema [da competitividade] está colocado, já está acontecendo, então, as medidas têm que ser endereçadas para a conjuntura. Há, obviamente, medidas de médio prazo. Por exemplo, todo o reforço na questão da inovação tecnológica, que está sendo feito. Estamos conseguindo mudar um pouco o padrão de comportamento das estratégias econômicas do setor privado. Mas isso, de fato, é para o médio e o longo prazo.

Valor: O BNDES calcula que o investimento programado nos setores industrial, de infraestrutura e de construção civil deve totalizar R$ 1,6 trilhão entre 2011 e 2014. O cenário internacional adverso não ameaça o levantamento desses recursos?

Coutinho: Apesar da crise, a abundância de capitais continua. Nosso problema é exatamente não cair na tentação de depender exclusivamente de ingressos de capitais para apoiar o nosso esforço de investimento. Senão, vamos repetir o problema dos anos 70 e de outros momentos, em que todo o incremento da taxa de investimento foi financiado por poupança externa. Nós também precisamos fazer um esforço de poupança doméstica. Este é um ponto que eu tenho batido o tempo todo.

Valor: De que forma?

Coutinho: As medidas que adotamos há seis meses, para estimular o financiamento privado, se não estiverem funcionando, terão que ser reforçadas, principalmente no sentido de aumentar o estímulo à poupança privada. Aquela agenda é essencial. O Brasil tem um potencial de poupança financeira doméstica que está todo ancorado num estoque de dívida pública altamente líquida. Esse estoque de poupança pode migrar para papéis privados. Acredito que ainda temos chance de avançar nisso.

Valor: Como?

Coutinho: À medida que o trabalho do Banco Central começa a ser reconhecido - a discussão agora é quando a inflação converge para a meta de 4,5% -, na hora em que houver a percepção de que o governo não vai dar moleza, que vai fazer o que for necessário para derrubar a inflação. O segredo é não desmontar o ciclo de investimentos e não jogar para escanteio a possibilidade de esse desenvolvimento financeiro acontecer. Obviamente, para esse desenvolvimento acontecer com velocidade, a perspectiva de retomada de queda da taxa Selic tem que vir junto. Isso é algo, talvez, para mais adiante.

Valor: Quando?

Coutinho: Ainda temos que dar um pouco mais de tempo para que a expectativa de inflação cadente se consolide. Na hora em que o mercado antecipar lá na frente que a inflação pode cair de novo e que o BC poderá começar a pensar em diminuir os juros, esse movimento [de estímulo à poupança privada] pode ocorrer.

Valor: O mercado estima que o Produto Interno Bruto (PIB) crescerá abaixo de 4% este ano. Por outro lado, a expectativa de inflação para 2012 está piorando, o que pode obrigar o BC a estender o ciclo de aperto monetário. Isso pode derrubar novamente o crescimento abaixo de 4%. O senhor não teme que isso desmonte o ciclo de investimentos previsto?

Coutinho: Hoje, o empresariado pensa quatro, cinco anos à frente. Há uma certa compreensão de que, se a economia crescer um pouco menos em 2011 e um pouco mais no próximo ano, e que mesmo não tendo um crescimento espetacular em 2012, haja uma expectativa de que no segundo semestre de 2012 já vai dar para começar a fazer uma afrouxamento, com a economia mundial melhorando em 2013 e 2014, você tem aí uma expectativa de que o Brasil consegue sustentar um ritmo médio de crescimento nos próximos anos.

Valor: Crescimento de quanto?

Coutinho: Na média dos quatro anos, alguma coisa variando de 4% a 5,5%, pode ser um pouco mais ou um pouco menos, será suficiente para a sustentação do plano de investimentos. É claro que se, de repente, surgir uma perspectiva um pouco mais otimista, o crescimento médio pode ser mais alto. O relevante é que não está no radar uma expectativa de recessão no Brasil. O que há é uma expectativa de moderação do crescimento por um prazo ainda a discutir. Isso ajuda porque o investimento industrial tem um prazo médio de maturação de no mínimo 18 meses. Então, o empresário está olhando o mercado de 2013.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

ATIIVDADE PRIVADA DE DIRIGENTE NÃO PODE SER GENERALIZADA, DIZ SECRETÁRIO GERAL DO PT

Lula e Dirceu podem cobrar, defende Pie

Autor(es): Cristiane Agostine | De São Paulo
Valor Econômico - 15/06/2011
Página A 10 - Política

Partidos: Secretário-geral do PT defende atividade privada de dirigentes mas diz que esta não deve virar regra

O PT vive um dilema: como justificar à sua base social e à militância o enriquecimento dos petistas do poder. Na semana passada, depois da queda de Antonio Palocci da Casa Civil, o secretário-geral do partido e ex-prefeito de Guarulhos, Elói Pietá, gerou polêmica ao defender, em artigo, a saída do ex-ministro como uma reação ao risco de distanciamento do PT em relação à sua base social. No segundo cargo mais importante da direção partidária, o dirigente defendeu relação distanciada de empresários e vida modesta para petistas.Nesta entrevista, quatro dias depois de publicar o texto, o dirigente petista defende as palestras pagas feitas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - a quem compara a Paulo Coelho e Chico Buarque -, elogia a participação dos empresários no governo Dilma Rousseff, diz que o ex-ministro e consultor empresarial José Dirceu continua exercendo sua "paixão pelo Brasil" e afirma que o PT tem que receber, sim, recursos privados, enquanto o financiamento público não for aprovado.

Vice-presidente da Fundação Perseu Abramo, ex-vereador, ex-deputado estadual, ex-prefeito e integrante da corrente minoritária do PT, Mensagem ao Partido, Pietá mostrou-se cauteloso e fez questão de gravar a entrevista. A seguir, seus principais trechos.


Valor: Por que o senhor escreveu o artigo só depois que Palocci saiu?

Elói Pietá: Nomear ou tirar ministros é uma tarefa da presidente Dilma e não uma tarefa do PT. Não queria colocar mais lenha na fogueira. A oposição já pressionava pela saída do ministro. Eu tinha expressado minha opinião para o presidente nacional do PT [ Rui Falcão] e tinha conversado com muitos dirigentes e militantes de base. Resolvi escrever um artigo que expressasse o que muita gente pensava no PT. Havia um sentimento muito forte entre os petistas de estranheza em relação aos resultados da atividade empresarial. Não que fosse ilegalidade, mas saía do padrão que a gente conhece no PT.

Valor: O senhor falou com alguém do governo? Qual a repercussão?

Pietá: Não. Minha relação é basicamente com o partido. O PT é o partido que apoia o governo, que tem interlocução e trajetória suficiente para ter expressão própria em determinados momentos. Muita gente manifestou concordância e achou que precisava levantar o debate sobre a relação entre o PT com grandes empresários. Agora também ouvi muitos silêncios. Algumas pessoas me disseram que eu fui muito duro. Talvez não divergisse tanto das ideias, mas do tom. Ninguém me repreendeu, mas não procurei continuar tratando desse assunto específico no PT.

Valor: O senhor disse que as condições materiais moldam ações. Moldaram também a de Lula, que ganha R$ 200 mil por palestra?

Pietá: Sociologia não é matemática. O presidente Lula é uma figura excepcional. É como se o Paulo Coelho fosse fazer uma conferência, se o Chico Buarque fosse fazer uma conferência. Ele é um líder mundial que desenvolve uma atividade política intensa. Agora quando vai fazer uma conferência em uma empresa, que tem grande lucratividade, tem que cobrar mesmo. Mas Lula não é empresário. Tem raízes profundas na maioria. Ele é o que a gente já sabe que ele é. Isso é definitivo.

Valor: Mas Lula esteve oito anos no governo, tem influência na gestão contato com empresários...

Pietá: Ele é chamado para fazer conferências sobre diversos assuntos do país e do mundo. Não podemos interditar um ex-presidente da República. Ele tem que continuar essa atividade por paixão pelo que ele faz no Brasil e no mundo. Quando se trata de uma empresa, tem direito de cobrar pela conferência. É uma pessoa na qual o Brasil confia e no qual confio intensamente. Ele sabe distinguir o que pode e o que não pode.

Valor: Palocci e Dirceu não sabem?

Pietá: O Dirceu foi injustamente cassado na Câmara. Tiraram o mandato dele e uma série de direitos políticos. Ele tem todo o direito de exercer a atividade que quiser na sociedade, a não ser que queiram cassar os direitos de cidadania dele também. Ele também continua exercendo sua paixão pelo Brasil, por uma sociedade mais igualitária. É um quadro de formação bastante sólida, como o Palocci. Quando escrevi o artigo foi no sentido de essa assistência de quadros importantes do PT a grandes grupos econômicos não se tornasse regra, porque se vira regra, muda a natureza do PT.

Valor: No artigo, ao se referir a Palocci, o senhor disse que o PT prefere o político de vida simples ao empresário bem-sucedido. Como o PT pretende lidar com os petistas que se tornaram empresários?

Pietá: Palocci e Dirceu são grandes quadros do PT, contribuíram muito para o Brasil e continuam firmemente petistas. Ninguém tem o monopólio de ser melhor que o outro. Meu artigo significa apenas que esse tipo de atividade não pode ser generalizada, sob pena de mudar nossa natureza.

Valor: E como deve ser a convivência com esses petistas que se tornaram empresários?

Pietá: Uma das razões pelas quais escrevi o artigo foi para suscitar o debate no PT e no sociedade. Sou favorável a essa aliança com o empresariado. Ela ajudou o Brasil a crescer, é uma aliança diferente do que se tentava fazer no fim do governo Vargas, no governo de João Goulart e o que se conseguiu fazer no governo Lula. É uma aliança trabalhadores-empresários, quando antes se tentava fazer uma aliança empresários-trabalhadores.

Valor: Não é contraditório o senhor defender que o PT mantenha distância do empresariado ao mesmo tempo em que os empresários têm um papel importante no governo?

Pietá: Não. O governo Lula já tinha feito o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e foi uma excelente iniciativa. Talvez o que fica um pouco estranho é o seguinte: distinguir o que é partido do que é governo. Às vezes nos acusam de fazer no governo tudo aquilo o que o partido quer. Não é verdade. O nosso governo é muito mais amplo do que o PT e os petistas que estão no governo têm que dialogar com todos. Esta foi uma opção do PT e o maior símbolo disso foi quando José Alencar se tornou o vice de Lula.

Valor: O senhor critica o financiamento privado de campanhas, mas o PT recebe recursos de empresas, mesmo com repasses do fundo partidário. Por quê?

Pietá: Mas é claro que recebe. O PT não pode chegar e dizer: olha, vou deixar que utilizem as vantagens do sistema político e eleitoral brasileiro apenas os outros. É legal, legítimo e democrático, só que não é a melhor coisa. Todo mundo tem que seguir a mesma regra. Não dá para alguém entrar no campo com 11 jogadores e outro com 7. O PT não pode chegar e dizer: "Vou ganhar o jogo com 7 jogadores e o meu adversário joga com 11".

Valor: O amplo leque de alianças não afasta o PT do governo?

Pietá: É por isso que o PT tem que manter sua identidade. Neste governo ele tem uma tarefa que é ajudar que o governo. A política é assim. Não há na história ninguém que tenha conseguido sucesso sem fazer alianças. O que não podemos é apagar as diferenças.

Valor: O PT está em busca de uma ideologia para este governo?

Pietá: Não estou propondo ideologia para o governo, estou discutindo o PT. O pensamento do nosso governo está claro. Em primeiro lugar, que o Brasil precisa ter uma economia sólida, com distribuição da renda e inclusão social, soberania internacional e diálogo entre todas as forças econômicas da sociedade. Isso se expressa em um governo de coalizão, portanto onde tem representantes de partidos e de setores da sociedade. O artigo é mais um alerta sobre o futuro do que sobre o presente.

terça-feira, 14 de junho de 2011

NESTA QUINTA, DEBATE SOBRE OS 6 MESES DE GOVERNO DILMA

A INFLAÇÃO, POR LINDBERG FARIAS

Inflação, Crescimento e Desenvolvimento

Lindbergh Farias
Senador – PT-RJ

Inflação não combina com desenvolvimento. A inflação corrói o desenvolvimento porque reduz o poder de compra dos salários e benefícios sociais. Sendo assim, a inflação reduz a capacidade do cidadão comprar, o que não combina com desenvolvimento porque desenvolvimento é, ao mesmo tempo, a universalização do acesso ao mercado de consumo.

A inflação, além disso, inibe a realização de projetos de investimento. Em cenários de elevação de preços, os empresários têm dificuldades de prever custos e rendas futuras. Então, tendem a optar pelo adiamento de planos de investimento, o que reduz a oferta de vagas de trabalho, o que gera desemprego que, por sua vez, também, não combina com desenvolvimento, que é, igualmente, a tentativa de universalização do acesso ao mercado de trabalho.

A economia brasileira experimentou, nos últimos anos, um tipo especial de crescimento. Em verdade, experimentou desenvolvimento, já que seu crescimento foi acompanhado de redução da taxa de desemprego, aumento do investimento, elevação das vendas do comércio varejista e distribuição da renda. Contudo, a inflação tem rondado a economia brasileira.

De 2007 aos dias de hoje, os serviços e os alimentos/bebidas têm sido os principais responsáveis pelo aumento da inflação. Por exemplo, no ano de 2010, a inflação, medida pela variação do IPCA, foi de 5,9%, enquanto, neste mesmo ano, os alimentos/bebidas aumentaram 10,4% e os serviços, 7,6%.

Existem alimentos/bebidas que têm seus preços cotados no Brasil (são chamados de não-comercializáveis) e aqueles que têm preços cotados no mercado internacional (chamados de comercializáveis). Por exemplo, o trigo, a soja e o açúcar têm seus preços determinados principalmente pelas demanda e oferta internacionais (que, por sua vez, dependem do crescimento econômico do mundo, de choques climáticos e também da especulação financeira nos mercados de commodities). E, ainda, sofrem a influência da taxa de câmbio. Os alimentos/bebidas não-comercializáveis são aqueles itens produzidos e consumidos no país: feijão, verduras, legumes, frutas, pescados etc. São principalmente afetados por choques de oferta decorrentes de acidentes climáticos.

Há ainda os alimentos/bebidas não-comercializáveis consumidos fora do domicílio que são as refeições, lanches e bebidas vendidos em restaurantes, lanchonetes ou similares. A elevação dos preços dos alimentos/bebidas não-comercializáveis consumidos fora do domicílio, muito provavelmente, está relacionada com a melhoria da distribuição de renda e a acentuada redução do desemprego dos últimos anos. Agora, muitos e muitas chefes de família têm recursos para levar os seus filhos para “almoçar fora” nos finais de semana; e durante a semana, necessitam almoçar fora do domicílio por conta da nova situação de “estarem empregados”.

Os serviços referem-se às despesas pessoais (emprego doméstico, manicure etc.), habitação (aluguel, condomínio etc.), educação/saúde/comunicação (mensalidades escolares, consultas médicas etc.) e transporte (ônibus escolar, taxi, ônibus urbano etc.).

O emprego doméstico tem tido seu valor aumentado por conta da política de valorização do salário mínimo. Cabeleireiro/manicure tem aumentado seus preços como resposta ao aumento de demanda decorrente da elevação do emprego e da melhor distribuição da renda. A elevação do valor do aluguel é decorrente do aquecimento do mercado imobiliário. O valor do condomínio tem subido por conta do aumento dos rendimentos dos seus empregados. O item transporte manteve-se bem comportado entre 2007 e 2010. Mas, em 2011, disparou; enquanto a inflação acumulada de janeiro a maio foi de 3,7%, o item transportes já aumentou no mesmo período quase 6%. Aqui a elevação dos preços do etanol e da gasolina tiveram grande influência.

Apesar do incômodo, a inflação está em trajetória de queda. Os números divulgados pelo IBGE em maio e junho já mostram uma tendência de desaceleração. Em abril, a variação do IPCA, foi de 0,77%; e, em maio, de 0,47% (esta é a quarta queda consecutiva este ano). O etanol que, em abril, havia subido 11,2%; em maio, caiu 11,34%; e a gasolina que havia subido, em abril, 6,3%; em maio, subiu, 0,85%. Os preços de alguns alimentos também caíram em maio. Por exemplo, o frango caiu 2%, os ovos, 1,2% e o feijão preto, quase 1%.

E, os mais recentes números sobre o crescimento do PIB também revelam a sintonia fina que o Governo vem fazendo para manter o binômio inflação-crescimento em patamar desejável. O PIB desacelerou de um ritmo de crescimento, acumulado em 12 meses, de 7,5% para 6,2%, no primeiro trimestre de 2011. Em relação ao trimestre anterior, o crescimento do PIB foi de 1,3% - com destaque para o crescimento da agropecuária (3,3%), indústria (2,2%) e serviços (1,1%). O crescimento da agropecuária auxilia a “acalmar” os preços de alimentos/bebidas.

Vale ser destacado que quando o Governo promoveu a desaceleração do PIB visando o controle da inflação teria que fazê-lo com muita destreza na medida em que deveria desacelerar o consumo das famílias e acelerar o crescimento do investimento. E isso foi alcançado, agora, no primeiro trimestre do ano. O consumo das famílias cresceu apenas 0,6% em relação ao trimestre anterior (contra um ritmo de 1,7% no trimestre out-dez de 2010); enquanto o investimento cresceu 1,2% (contra um ritmo de 0,4% no trimestre anterior).

Em resumo, parte da inflação que temos tido vêm do exterior. E, outra parte é decorrente (sim!) do nosso modelo de crescimento econômico que é gerador de empregos e distributivo de renda - o que faz a demanda por bens e serviços aumentar, assim como faz aumentar as despesas com a contratação de emprego doméstico devido à política de valorização real do salário mínimo.

Esse diagnóstico da dinâmica da inflação é compartilhado por técnicos do Governo e do Banco Central. Abandonou-se a velha prática de culpar somente a demanda por qualquer tipo de inflação. Antes, a regra adotada pelo Banco Central era simples: se havia pressão inflacionária, era porque a demanda estava maior que a oferta, então, a solução era “vamos aumentar os juros” para reduzir a demanda. Agora, o diagnóstico está baseado em uma busca detalhada das causas da inflação. Ademais, o Governo busca manter a estabilidade monetária aumentando o investimento e o crédito para este fim – assim, crescem a oferta de bens (por exemplo, alimentos/bebidas) e serviços (como os transportes). A estabilidade monetária não depende somente da demanda doméstica. Mas, também, da oferta doméstica (isto é, depende do volume de investimentos) e de movimentos no mercado internacional de commodities.

A manutenção da estabilidade monetária tornou-se mais sofisticada. Mais instrumentos antiinflacionários são utilizados: medidas macroprudenciais, recomposição fiscal, controle de preço intermediário da gasolina e política de crédito e investimentos para ampliação da oferta de bens e serviços na economia. E, a estratégia gradualista está incorporada: a meta para a inflação não é mais buscada para o ano corrente. Em oposição à estratégia gradualista, existia a estratégia de choque: que era a elevação mais intensa dos juros (taxa Selic), como único instrumento, para que a inflação alcançasse o centro da meta em dezembro de cada ano.

Em conclusão: a inflação moderada que temos hoje é muito diferente, por exemplo, da inflação inercial que enfrentamos na época do Plano Real. Nos dias de hoje, ela tem causas variadas. É preciso diagnosticá-la com mais precisão para que instrumentos adequados sejam utilizados. Além das causas externas, o nosso modelo de desenvolvimento traz (sim!) dentro de si alguma inflação. Não porque o Governo gasta demais, mas porque promove o crescimento do emprego e a distribuição da renda e, em consequência, a demanda tornou-se crescente.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

PARA ONDE VAI O GOVERNO DILMA?

Palocci: é a política, estúpido! E agora, Dilma?

publicada quarta-feira, 08/06/2011 às 17:26 e atualizada quinta-feira, 09/06/2011 às 11:43

por Rodrigo Vianna

A queda de Palocci gerou debates acalorados na internet. Recapitulemos. O principal ministro do governo, acuado por denúncias de ter enriquecido 20 vezes enquanto exercia o mandato de deputado federal pelo PT, manteve-se calado por 20 dias. Quando resolveu falar, escolheu: entrevista exclusiva para a Globo.

O meio é a mensagem. Muita gente discutiu os argumentos do ministro naquela entrevista, as explicações, o tom “sóbrio”. O recado principal ali era outro: Palocci indicou que tinha (e tem) aliados poderosos no “establishment”. O meio é a mensagem. Falar à Globo – com exclusividade – é uma forma de dizer: eu sigo forte entre aqueles que mandam ou imaginam que mandam no Brasil. Isso era fundamental para que Palocci se sentisse mais “protegido” ao sair do governo.

Na segunda-feira, veio a decisão da Procuradoria Geral da República (PGR): o procurador não enxergou motivos (jurídicos) para investigar Palocci. Em alguns blogs e no twitter, choveram conclusões apressadas: “aí está a prova de que os detratores de Palocci estavam errados, ele é inocente, não há sequer indícios contra o ministro”. Espalharam-se ataques contra o jornalista Ricardo Kotscho, que havia escrito no blog dele, no dia da entrevista pra Globo: “Palocci escolheu a guilhotina”. Kotscho errou feio, diziam alguns. Errou??

Outros blogueiros (entre eles esse escrevinhador), que escolheram o caminho da crítica (política) a Palocci, foram acusados de “traidores” e “oportunistas”. Um certo stalinismo de botequim espalhou-se por aí: quem não defende o governo unilateralmente é “traidor”. Hehe. Nessa, eu não caio.

Quem achou que a decisão da PGR era uma “vitória definitiva” de Palocci, desculpe-me, mas não entende muito de política. Palocci permaneceu no cargo durante mais de 20 dias justamente com esse objetivo: usar o cargo para evitar estragos maiores (especialmente na área judicial). Na segunda-feira, diante das conclusões apressadas dando conta da ”vitória jurídica” de Palocci, escrevi no twitter o que me parecia o óbvio ululante: a questão era – e continua a ser – política.

Agora que Palocci caiu, alguns blogueiros e tuiteiros que respeito muito dizem que “o governo acabou”. Bobagem…

Esse é um governo em disputa – ainda mais agora, com o rearranjo de forças. De minha parte, acho que o problema de Dilma não foi a queda de Palocci, mas sua nomeação numa função tão importante. Quando digo que a questão era, e é, política, refiro-me justamente a isso: a escolha de Palocci simbolizava a escolha de um nome completamente comprometido com o mundo financeiro e o grande capital. Em 2003, Lula precisava de um nome assim. FHC entregara o país à beira da bancarrota. Palocci cumpriu essa tarefa. Depois, foi derrubado pela soberba – no vergonhoso episódio do caseiro.

Dilma não precisava e não precisa disso. Ah, mas foi o Lula que indicou Palocci. E daí? Lula é um ser iluminado que não erra? Sigo a entender que Lula foi o melhor presidente da República, ao lado do Getúlio Vargas dos anos 50. Nem por isso deixaram (Vargas e Lula) de cometer erros.

A escolha de Palocci para a Casa Civil soma-se a outras escolhas da presidente Dilma – que apontam num rumo claro: o governo caminhou alguns graus rumo ao centro, na comparação com o segundo mandato de Lula – que foi razoavelmente avançado, um governo social-democrata clássico.

A saída de Palocci pode abrir caminho para um novo arranjo. Ninguém espera um governo “socialista” ou de “esquerda” na gestão Dilma. Claro está que a correlação de forças no Brasil exige acordos. Mas quem vai estar ao leme? Quem vai ter a hegemonia do processo? Num texto recente, escrevi sobre os risco das últimas escolhas de Dilma. Dizem por aí que as pesquisas já mostrariam certa queda no apoio à presidenta. Por conta do desgaste gerado pelo caso Palocci no noticiário. Isso é conjuntural. Mais grave pra mim é a corrosão de longo prazo: setores de esquerda sentem-se longe desse governo que prometia ser a continuidade de Lula.

O portal “Sul21″, que tem certa proximidade editorial com o governador petista Tarso Genro (RS), é muito claro na avaliação da queda de Palocci: “Soberba x Prestação de Contas”. Blogueiros como Idelber Avelar e Renato Rovai também escreveram texto curtos e precisos sobre o significado da queda de Palocci. Nenhum deles pode ser apontado como “traidor”, “oportunista”, ou “agente infiltrado do PIG”.

A ideia de que a queda de Palocci significa a “capitulação” de Dilma ao PIG é simplista. Foi Dilma quem tentou um acordo com a velha imprensa, no início do mandato: foi à “Folha”, à Globo, e deu sinais indiretos de que não iria avançar na “Ley de Medios” preparada por Franklin Martins. Escolhas. Palocci, no centro do governo, certamente tinha muito a ver com essas escolhas.

Essas escolhas criaram certo mal-estar entre gente que apoiou e/ou votou em Dilma durante a dura batalha de 2010. A queda de Palocci pode ser o símbolo de uma fase nova no governo.

O PT e o governo, se deixaremde lado o medo e os acertos “por cima”, podem usar o episódio Palocci contra a oposição. Se Palocci caiu por “enriquecer sem explicações convincentes”, o que dizer de Aécio e sua frota de carros na rádio? O que dizer da filha de Serra?

Não é por outro motivo que Serra (e muitos tucanos) ficaram ao lado de Palocci nesse episódio. Palocci era uma ponte com os tucanos e o empresariado atucanado.

A ponte ruiu. Isso não quer dizer que o governo Dilma vai avançar nas áreas onde tropeça e cede ao conservadorismo (Cultura, Relações Internacionais, Meio Ambiente). Mas a chance existe.

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sexta-feira, 10 de junho de 2011

LIÇÕES DA CRISE, POR EMIR SADOR

Lições da crise

Por Emir Sader

Uma vez desencadeada uma crise como a do caso Palocci, o melhor a fazer é desativá-la rapidamente.

1. Bombas de tempo podem tardar a explodir, mas terminam explodindo.

2. Devem ser examinados exaustivamente os antecedentes de todos os que vão ocupar cargos públicos.

3. Uma vez estourada uma crise como essa, melhor desativá-la rapidamente. Deixar sangrar provoca danos muito maiores.

4. O zelo pela questão da ética publica, além de ser um fim em si mesmo, afeta diretamente os setores mais dinâmicos de apoio ao governo: militância de esquerda, movimentos sociais, juventude, artistas, intelectuais, formadores de opinião publica em geral. Deve-se cuidá-los como a menina dos olhos.

5. Quando mudar, tratar sempre de inovar na escolha de quadros. A politica brasileira precisa disso.

6. Acompanhar as mudanças com discurso que explica o significado delas.

7. A consciência das intenções de quem faz acusações pode ser clara, sem que elas deixem de ser verdadeiras.

8. A recuperação do prestígio da prática politica requer um cuidado estrito com a ética pública.

9. Não precipitar declarações incondicionais de apoio a pessoas que recebem acusações, antes do apuro rigoroso delas.

10. Os partidos devem ter suas próprias posições, mais além do apoio firme ao governo. Devem expressar os sentimentos e as posições da militância do partido, dos movimentos sociais e do campo popular.

11. Apoio do PMDB é sempre abraço de urso.

12. A mídia privada continua com grande poder de definir a agenda nacional e derrubar ministros.

13. Fazer política, exercer o poder não é atividade técnica, nem de repartição de cargos, mas uma combinação de persuasão e força, isto é, construção de hegemonia.

http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=711

quinta-feira, 9 de junho de 2011

SAI PALOCCI, QUEM SERÁ O PRÓXIMO?

A grande mídia pode muito, mas não pode tudo

Após a queda de Palocci, eu observo várias indagações sobre quem será o próximo ministro a ir para o sacrifício, por conta das artimanhas e aleivosias perpretadas pela mídia na ânsia de combater o governo Dilma. A conclusão que eu retiro disso é que quem faz tal indagação, opera com o pressuposto de que a mídia pode tudo, inclusive fazer acusações inconsistentes e atingir os seus objetivos com isso. Esta pelo menos é a forma com que os defensores do ex-ministro Palocci tratam o episódio que precipitou a sua demissão. Um grande engano.

É fato que a principal mídia brasileira, diante da fragilidade dos partidos com os quais se identifica, assumiu o papel de vanguarda de oposição ao governo Dilma, como o fez em relação ao de Lula, nesse sentido cumpre com zelo a tarefa de levantar e alimentar aqueles partidos de informações que criam algum tipo de constrangimento para o governo federal.

Do ponto de vista programático o trabalho é diário, ora manipulando informações através de manchetes e chamadas de capa dos jornais, bem como os números da economia brasileira, ora insistindo no terrorismo da expectativa de aumento da inflação, mesmo quando ela dá sinais de queda, ora na cobrança sobre o governo para que ele radicalize na adoção de um ajuste fiscal, que estabelaça cortes em recursos para obras, projetos, programas sociais e contratação de equipamentos e pessoal para a máquina pública, para garantir mais recursos e incorpar o nosso já corpulento superavit primário, uma das fontes de recursos destinados a remuneração dos títulos da nossa dívida interna pública, que, como se sabe, a maior parte está em poder de fundos de investimentos e instituições financeiras, enfim do chamado mercado.

Por conta desta operação econônomica e dos altos juros praticados no país, como reconhece o próprio Lula, os ricos nunca ganharam tanto quanto ganharam no seu governo. E a nossa mídia plutocrata é a bastiã da defesa de tais interesses. Não é birra, mero preconceito - já que agora não é mais um operário que ocupa a presidência - é uma questão ideológica, classista, em relação ao PT, a esquerda brasileira, que os nossos adversários revelam ter mais clareza do que muitos de nós. Se tornar rico no Brasil, com o se tornou Palocci, não pode ser tratado como mera obra do acaso, reconhecimento de competência, mas como um processo de aceitação e/ou cooptação, principalmente quando a origem de tal riqueza vem da generosidade da própria plutocracia brasileira.

Agora, uma coisa é a mídia buscar assunto para colocar o governo Dilma contra a parede, do ponto de vista da postura pública e privada, comportamento, vida pregressa dos seus principais assessores, mas para que isso vingue, ela precisa de material que sustente tal denúncia, consistência, caso contrário ela cairá no esquecimento como tantas outras cairam. Até porque com o ampliação da presença e poder de difusão de informações das chamadas redes sociais e a presença de outras mídias "não tão hostis" que na campanha eleitoral fizeram contraponto às Organizações Globo, como Record e SBT, porque têm interesses comerciais junto ao governo, o monopólio de informação que aquela organização e das demais que a seguem, não possuem o mesmo peso de outrora.

Então quem será o próximo? Após os episódios de 2005, onde errou-se muito no PT, a começar pelos que acharem que Roberto Jefferson e Marcos Valério eram interolutores confiáveis, não dá para atribuir tão-somente ao papel da mídia - já que caixa 2 é usual mas é ilegal -, não me recordo quando, graças as pressões exercidas pela mídia, o governo Lula demitiu algum ministro. Salvo, é claro, Erenice Guerra, porque as denúncias contra ela possuiam sustentação, não eram retóricas, e estava-se no desfecho do primeiro turno da eleição, o que exigia do governo uma resposta rápida para a opinião pública.

Ao longo do governo Lula, não faltaram pressões de toda ordem contra Mântega, cuja filha foi acusada de tráfico de influência, contra Lula e seus filhos, contra Franklim Martins, que se tornou o alvo principal da grande mídia, contra o Hadad, da Educação, e tantos outros. Claro que, a exceção de Martins, os alvos eram e sempre serão ministros petistas, pois dão repercussão, já que o partido era a principal sustentação do governo Lula, da mesma forma que será no de Dilma, e o que mais cresce no país.

Com efeito, não vamos confundir alhos com bugalhos, pois pressões exercidas em relação a ministra Ana de Hollanda são programáticas e partilhadas por gente que está na base de apoio do governo e do PT. E quanto a isso a posição da grande a mídia é dúbia, pois estão envolvidos no debate sobre a reforma da legislação do direito autoral e do Ecad, interesses diretamente vinculados a gravadoras e editoras que com ela (a grande mídia) têm proximidade comercial quando não são associadas. Logo, a posição da grande mídia neste tema vai depender para que lado vão o debate e Ana de Holanda. Da mesma forma que com Paulo Bernardo, em função dos interesses que estão envolvidos em torno do ministério que ele pilota. Aí é a grande mídia fazendo política e defendendo os seus interesses corporativos.

Enfim, quem será o próximo? Certamente buscarão que seja do PT, pelas razões já expostas, e só vingará se houver consistência.

No caso do Palocci há um erro de origem que a auto suficiência própria do poder, não permite que seja reconhecido. No afã de colocar num cargo chave do governo, um político pelo fato dele ter amplo trânsito junto ao mercado financeiro e ao empresariado brasileiro, imaginou-se que ele estaria blindado da sanha dos principais adversários do governo Dilma, já que sendo amigo desses setores e sabendo-se da influência que esses setores têm sobre a mídia não haveria problemas para o governo, pelo menos nesta área. Pois, como bem destacou o dirigente petista Francisco Rocha, o Rochinha, num artigo em defesa de Palocci, ele era amigo dos caras.

Com isso, a cúpula do governo substimou o efeito explosivo que poderia ter o fato do seu ministro, e ex-ministro da Fazenda do governo Lula, já marcado por uma demissão em função do escândalo do vazamento do sigilo bancário de um caseiro - que apesar da absolvição do STF por falta de provas, foi confirmado recentemente -, ter enriquecido da noite pro dia - sim, porque os pagamentos pelos serviços de quatro anos vieram todos no mês de dezembro - prestando consultoria a algumas das maiores empresas privadas que atuam no país e que possuem interesses comerciais que são influenciados por decisões políticas do Estado brasileiro.

Esqueceram da fábula do sapo e do escorpião