terça-feira, 14 de junho de 2011

A INFLAÇÃO, POR LINDBERG FARIAS

Inflação, Crescimento e Desenvolvimento

Lindbergh Farias
Senador – PT-RJ

Inflação não combina com desenvolvimento. A inflação corrói o desenvolvimento porque reduz o poder de compra dos salários e benefícios sociais. Sendo assim, a inflação reduz a capacidade do cidadão comprar, o que não combina com desenvolvimento porque desenvolvimento é, ao mesmo tempo, a universalização do acesso ao mercado de consumo.

A inflação, além disso, inibe a realização de projetos de investimento. Em cenários de elevação de preços, os empresários têm dificuldades de prever custos e rendas futuras. Então, tendem a optar pelo adiamento de planos de investimento, o que reduz a oferta de vagas de trabalho, o que gera desemprego que, por sua vez, também, não combina com desenvolvimento, que é, igualmente, a tentativa de universalização do acesso ao mercado de trabalho.

A economia brasileira experimentou, nos últimos anos, um tipo especial de crescimento. Em verdade, experimentou desenvolvimento, já que seu crescimento foi acompanhado de redução da taxa de desemprego, aumento do investimento, elevação das vendas do comércio varejista e distribuição da renda. Contudo, a inflação tem rondado a economia brasileira.

De 2007 aos dias de hoje, os serviços e os alimentos/bebidas têm sido os principais responsáveis pelo aumento da inflação. Por exemplo, no ano de 2010, a inflação, medida pela variação do IPCA, foi de 5,9%, enquanto, neste mesmo ano, os alimentos/bebidas aumentaram 10,4% e os serviços, 7,6%.

Existem alimentos/bebidas que têm seus preços cotados no Brasil (são chamados de não-comercializáveis) e aqueles que têm preços cotados no mercado internacional (chamados de comercializáveis). Por exemplo, o trigo, a soja e o açúcar têm seus preços determinados principalmente pelas demanda e oferta internacionais (que, por sua vez, dependem do crescimento econômico do mundo, de choques climáticos e também da especulação financeira nos mercados de commodities). E, ainda, sofrem a influência da taxa de câmbio. Os alimentos/bebidas não-comercializáveis são aqueles itens produzidos e consumidos no país: feijão, verduras, legumes, frutas, pescados etc. São principalmente afetados por choques de oferta decorrentes de acidentes climáticos.

Há ainda os alimentos/bebidas não-comercializáveis consumidos fora do domicílio que são as refeições, lanches e bebidas vendidos em restaurantes, lanchonetes ou similares. A elevação dos preços dos alimentos/bebidas não-comercializáveis consumidos fora do domicílio, muito provavelmente, está relacionada com a melhoria da distribuição de renda e a acentuada redução do desemprego dos últimos anos. Agora, muitos e muitas chefes de família têm recursos para levar os seus filhos para “almoçar fora” nos finais de semana; e durante a semana, necessitam almoçar fora do domicílio por conta da nova situação de “estarem empregados”.

Os serviços referem-se às despesas pessoais (emprego doméstico, manicure etc.), habitação (aluguel, condomínio etc.), educação/saúde/comunicação (mensalidades escolares, consultas médicas etc.) e transporte (ônibus escolar, taxi, ônibus urbano etc.).

O emprego doméstico tem tido seu valor aumentado por conta da política de valorização do salário mínimo. Cabeleireiro/manicure tem aumentado seus preços como resposta ao aumento de demanda decorrente da elevação do emprego e da melhor distribuição da renda. A elevação do valor do aluguel é decorrente do aquecimento do mercado imobiliário. O valor do condomínio tem subido por conta do aumento dos rendimentos dos seus empregados. O item transporte manteve-se bem comportado entre 2007 e 2010. Mas, em 2011, disparou; enquanto a inflação acumulada de janeiro a maio foi de 3,7%, o item transportes já aumentou no mesmo período quase 6%. Aqui a elevação dos preços do etanol e da gasolina tiveram grande influência.

Apesar do incômodo, a inflação está em trajetória de queda. Os números divulgados pelo IBGE em maio e junho já mostram uma tendência de desaceleração. Em abril, a variação do IPCA, foi de 0,77%; e, em maio, de 0,47% (esta é a quarta queda consecutiva este ano). O etanol que, em abril, havia subido 11,2%; em maio, caiu 11,34%; e a gasolina que havia subido, em abril, 6,3%; em maio, subiu, 0,85%. Os preços de alguns alimentos também caíram em maio. Por exemplo, o frango caiu 2%, os ovos, 1,2% e o feijão preto, quase 1%.

E, os mais recentes números sobre o crescimento do PIB também revelam a sintonia fina que o Governo vem fazendo para manter o binômio inflação-crescimento em patamar desejável. O PIB desacelerou de um ritmo de crescimento, acumulado em 12 meses, de 7,5% para 6,2%, no primeiro trimestre de 2011. Em relação ao trimestre anterior, o crescimento do PIB foi de 1,3% - com destaque para o crescimento da agropecuária (3,3%), indústria (2,2%) e serviços (1,1%). O crescimento da agropecuária auxilia a “acalmar” os preços de alimentos/bebidas.

Vale ser destacado que quando o Governo promoveu a desaceleração do PIB visando o controle da inflação teria que fazê-lo com muita destreza na medida em que deveria desacelerar o consumo das famílias e acelerar o crescimento do investimento. E isso foi alcançado, agora, no primeiro trimestre do ano. O consumo das famílias cresceu apenas 0,6% em relação ao trimestre anterior (contra um ritmo de 1,7% no trimestre out-dez de 2010); enquanto o investimento cresceu 1,2% (contra um ritmo de 0,4% no trimestre anterior).

Em resumo, parte da inflação que temos tido vêm do exterior. E, outra parte é decorrente (sim!) do nosso modelo de crescimento econômico que é gerador de empregos e distributivo de renda - o que faz a demanda por bens e serviços aumentar, assim como faz aumentar as despesas com a contratação de emprego doméstico devido à política de valorização real do salário mínimo.

Esse diagnóstico da dinâmica da inflação é compartilhado por técnicos do Governo e do Banco Central. Abandonou-se a velha prática de culpar somente a demanda por qualquer tipo de inflação. Antes, a regra adotada pelo Banco Central era simples: se havia pressão inflacionária, era porque a demanda estava maior que a oferta, então, a solução era “vamos aumentar os juros” para reduzir a demanda. Agora, o diagnóstico está baseado em uma busca detalhada das causas da inflação. Ademais, o Governo busca manter a estabilidade monetária aumentando o investimento e o crédito para este fim – assim, crescem a oferta de bens (por exemplo, alimentos/bebidas) e serviços (como os transportes). A estabilidade monetária não depende somente da demanda doméstica. Mas, também, da oferta doméstica (isto é, depende do volume de investimentos) e de movimentos no mercado internacional de commodities.

A manutenção da estabilidade monetária tornou-se mais sofisticada. Mais instrumentos antiinflacionários são utilizados: medidas macroprudenciais, recomposição fiscal, controle de preço intermediário da gasolina e política de crédito e investimentos para ampliação da oferta de bens e serviços na economia. E, a estratégia gradualista está incorporada: a meta para a inflação não é mais buscada para o ano corrente. Em oposição à estratégia gradualista, existia a estratégia de choque: que era a elevação mais intensa dos juros (taxa Selic), como único instrumento, para que a inflação alcançasse o centro da meta em dezembro de cada ano.

Em conclusão: a inflação moderada que temos hoje é muito diferente, por exemplo, da inflação inercial que enfrentamos na época do Plano Real. Nos dias de hoje, ela tem causas variadas. É preciso diagnosticá-la com mais precisão para que instrumentos adequados sejam utilizados. Além das causas externas, o nosso modelo de desenvolvimento traz (sim!) dentro de si alguma inflação. Não porque o Governo gasta demais, mas porque promove o crescimento do emprego e a distribuição da renda e, em consequência, a demanda tornou-se crescente.

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