quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

A CHINA DE 2010, O MUNDO E O BRASIL

A China vai continuar puxando o mundo?

Dezembro de 2009

Especialistas no país costumam referir-se à “China profunda”, para explicitar que os ocidentais têm contato apenas com a superfície do fenômeno, e conhecer realmente a China é muito mais difícil do que parece, mesmo para quem se incumbe disso há bastante tempo. Não apenas por causa dos quatro mil anos de história, dezenas de etnias e línguas faladas e escritas, ou as aparentes contradições econômicas e políticas. Essa “China profunda” seria a China “autêntica”, ainda bastante pobre e atrasada em todos os aspectos, o país dos 800 milhões de pessoas das áreas rurais, onde os costumes agrários mantêm-se vivos e fortes, e também de grande parte da população da periferia das maiores cidades, recém-chegada do interior.

A existência dessa “China profunda” é a razão maior do país continuar puxando o mundo pelos próximos 30(50?) anos, na marcha do desenvolvimento da costa para “dentro”, visando a redução das desigualdades, entre rurais e urbanos, e das cidades litorâneas e do interior. É necessário, para isso, manter o ritmo frenético de crescimento econômico, e dar conta da urbanização de 600 e tantas cidades, com populações entre 200 mil e quatro milhões de pessoas. Essa melhoria de vida acelerada consumirá trilhões de dólares, quantidade inacreditável de materiais e equipamentos de construção civil, infra-estruturas de energia, telecomunicações, e tudo o mais que a vida nas cidades modernas demanda.

Mas a transformação da China milenar e agrária, em um país urbano e high-tech, requer muito mais do que cidades novas. Trata-se de literalmente urbanizar mais de meio bilhão de pessoas rurais, no tempo equivalente a duas gerações. Evidentemente, a parte rápida é a da engenharia, do concreto e do aço. Já a parte da “transformação” dessas pessoas rurais em urbanas, agricultores em empresários e trabalhadores dos setores industrial e de serviços, é o grande desafio. Sua escala, diferenciações e velocidade do processo tornam tudo mais difícil de compreender.

As repercussões “sísmicas” desse fenômeno em todo o mundo ainda são pouco estudadas, talvez porque poucos conhecem verdadeiramente a China, e menos ainda acreditam na determinação dos chineses em levar o desenvolvimento a toda a população do país, inclusive à da “China profunda”. (Imagine-se o que aconteceria no mundo, se a Índia e a China, com os seus 2,5 bilhões de habitantes somados, mantivessem o ritmo chinês, nos próximos 30 anos...)

Resumindo bastante, a China em 2010 será mais do mesmo: investimentos crescentes no exterior, avanço agressivo nos mercados do Brasil e instalação de empresas chinesas no país para atuarem a nível continental. Internamente, continuar os investimentos na infra-estrutura das regiões Centro-Norte e Oeste, Ciência e Tecnologia, produção de energia (petróleo, solar, eólica) e de alimentos. Ou seja, a China continuará à frente das maiores economias, na cola dos EUA e mantendo o ritmo de 8%-10% anuais de crescimento. Para o Brasil, significa a possibilidade de aumentar mais a balança comercial com o país, que hoje é o seu maior parceiro – mas era apenas o 12º maior em 2000. Se houve crescimento de 2.365% da balança Brasil-China nos últimos dez anos, passando de menos de US$2 bilhões em 1998, para US$36,4 bilhões em 2008, por que não continuar nesse ritmo em 2010?

Essa é uma questão difícil de ser respondida agora pelo setor exportador brasileiro, que pena com o câmbio há dois anos. Conjunturas adversas dificultam decisões estratégicas, e esse é o caso do investimento na China: exige estudar o país, conhecer in loco o mercado, saber quem é quem, tornar-se conhecido, compreender as diferenças, estabelecer relacionamentos... São dois anos de trabalho prévio, pelo menos – quem pretende entrar lá em 2011, tem que começar a ir imediatamente. Como aliás está fazendo o Pólo de Excelência do Leite, de Minas Gerais, de olho no excedente de 5 bilhões de litros, previsto para 2013, e na demanda chinesa de produtos lácteos nos próximos anos.

Milton Pomar, geógrafo e trabalha numa empresa de consultoria que mantém intercâmbio permanente com a China, para onde viaja frequentemente a trabalho

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