quinta-feira, 4 de novembro de 2010

PT DO RIO: BALANÇO E MUDANÇA DE POSTURA


Contribuição para o debate político partidário

Dilma foi eleita presidenta do Brasil, numa das mais duras disputas eleitorais que o pais experimentou - menos pelo resultado final, mas pelo processo em sí - e começa a discutir a formação do novo governo. As perspectivas são favoráveis, haja vista o fato dela conhecer de perto os problemas a serem enfrentados, em função da sua gestão ser de continuidade da que se encerra no dia 31 de dezembro, da qual teve uma participação destacada, e o legado deixado pelo presidente Lula ser em geral bastante positivo. O fato novo é a virulência com que a candidatura adversária e a parcela da imprensa que a apoiava, responde ao resultado das urnas, como se apontasse para perspectiva de um inexistente terceiro turno eleitoral.

Uma vitoria, sobretudo, da militância petista. Não só porque ela tomou as ruas para defender a candidatura de Dilma Rousseff. Mas, acima de tudo, porque foi ela num momento delicado da disputa, na primeira semana do segundo turno, que cobrou e conquistou uma mudança da postura da coordenação da campanha e da candidata, que se deslocasse da lógica dos manuais de marqueting eleitoral, cujo o principal axioma é "quem ataca perde" e assumisse uma postura de ofensiva política tanto no debate programático, quanto numa ação de desconstrução da hipocrisia da campanha adversária, ocupasse as ruas e investisse no contato direito com o eleitorado, que é o ambiente natural de qualquer candidatura petista. A postura de Dilma Rousseff no debate da Bandeirantes retrata bem tal inflexão, que mudou o rumo da campanha, anteriormente ancorada nas aparições no horário eleitoral "gratuito" de rádio e tv, e o ânimo da militância petista.

No entanto, é arrogante e equivocado subestimar o papel dos aliados, numa eleição que de início parecia tranquila, mas que acabou sendo bastante complicada, sejam eles sociais, partidários ou midiáticos. Mas não custa lembrar da experiência petista fluminense com o nosso principal aliado no estado, o governador Sérgio Cabral - que viajou para o exterior logo após realização do primeiro turno -, quando ele e seu partido só assumiram efetivamente a campanha do segundo turno, após as pesquisas sinalizarem que a candidatura de Dilma Rousseff retomava a rota de crescimento.

Agora, retoma-se como nos pleitos anteriores, o necessário balanço sobre desempenho do PT no Estado do Rio, e as indagações sobre a contínua queda de sua influência política e densidade eleitoral não só na classe média da zona sul, como ficou patente na performance eleitoral de Dilma e Serra na cidade do Rio de Janeiro, mas no conjunto do estado. Um tema que há muito precisa ser enfrentado, mas o partido não revela capacidade e vitalidade para fazê-lo através de fóruns e instâncias próprias. Salvo iniciativas isoladas de uma zonal, um núcleo ou um múnicípio, mas sem continuidade, inexiste este debate realizado com responsabilidade e desdobramentos políticos

Em breve e recente conversa com o deputado federal Luiz Sérgio, em quem eu não votei para presidente do PT, mas reconheço que se conduz de forma positiva a frente da direção estadual, porque está disposto a escutar, dialogar e mediar com todas as forças políticas que atuam no partido, não apenas com a qual ele integra, eu levantei a necessidade da criação de um núcleo e um debate estratégico do PT no estado. Algo de fôlego que encontre um diagnóstico, e a partir dele produza decisões políticas táticas e estratégicas. Enfim, que o partido tenha um mínimo de planejamento na sua ação rumo a conquista dos seus objetivos políticos.

Me incomoda de forma permanente o fato de após cada desempenho ruim ou descolado do desempenho nacional do partido, em eleições tanto no estado quanto na capital, o que tem sido a regra, a direção do partido no estado, além de não produzir um balanço para debate com a militância, convoque aquelas plenárias horrorosas, na qual se inscrevem 40 ou 50 filliados para avaliações, e nada se retira disso. Aí o partido dá por encerrado o seu balanço político e eleitoral e a vida continua, no caminho dela a perspectiva de derrotas iminentes.

Com efeito, a partir da constatação de que no primeiro turno o que salvou o PT no Rio de um desastre eleitoral foi a eleição de Lindberg Farias ao senado e o aumento da nossa votação em legenda. Um crescimento em parte devido ao desempenho do próprio Lindberg, e a decisão correta da coordenação estadual da campanha, dele aparecer no horário eleitoral gratuito das candidaturas proporcionais, pedindo votos para a legenda do PT. Haja vista o desempenho das nossas votações proporcionais, a fraca e reduzida chapa que montamos para a câmara federal, quando a exitosa tática nacional do partido era aumentar a sua representação parlamentar, e o fraco desempenho da Dilma em algumas das prefeituras administradas pelo PT, com destaque para Petrópolis e Teresóplis.

Fixa-se muito a análise nos malogrados resultados eleitorais individuais de candidaturas petistas, mas - e por isso- se perde a noção do contexto geral de montagem da campanha petista no estado, quando a direção do partido não estimulou a construção e o lançamento de candidaturas à câmara federal na maioria das cidades do estado com mais de 200 mil eleitores, como Campos, Petrópolis, Volta Redonda, Nova Iguaçu, Duque de Caixas e São João de Meriti. Em São Gonçalo, segundo colégio eleitoral do estado, onde o PT possui dois vereadores, o partido teve dois candidatos a câmara federal lançados por iniciativas pessoais, sem densidade eleitoral e entregues a própria sorte (sem qualquer ajuda partidária que, pelo menos, potencializasse os seus desempenhos, como contribuição para a votação geral da legenda) e não lançou candidatura a deputado estadual.

O cenário de Petrópolis, cidade com mais de 200 mil eleitores administrada pelo PT, onde Serra obteve 59% e Dilma 41% dos votos, merece destaque, pois deverá estar consagrado no manual de como não se deve produzir uma tática eleitoral, inclusive como projeção para a construção partidária local e a manutenção da prefeitura sob comando do PT. Além de não lançar candidato à câmara federal, o partido sequer lançou a deputado estadual, quando se sabe que o prefeito Paulo Mustrangi, venceu a eleição municipal mas o partido não elegeu vereador na cidade, e deste jeito vai permanecer com dificulade de eleger.

Num quadro em que o voto de reduto político cada vez mais cresce, isso revela que os problemas do partido vão muito mais além da perda da influência na zona sul e na classe média do Rio de Janeiro. È de falta de direção política coletiva, capaz de atuar com um mínimo de planejamento, que não monta, e deixa que sejam montadas, chapas proporcionais descoladas da realidade regional e eleitoral do estado. No final é o conhecido corre, corre, atrás de candidaturas de mulheres para fechar as chapas. Não houve um trabalho e um estímulo prévios de incentivo a tais candidaturas, num ambiente propício onde uma mulher era lançada candidata a presidência da república pelo PT.

Dado o resultado final da nossa eleição proporconal, pode-se constatar que ele foi pior do que em 2006, quando o partido disputou em dificuldades maiores, por conta da repercussão política das denúncias do suposto mensalão. Naquela, elegemos seis federais (agora cinco) e seis estaduais, com sobra de votos para eleger sete (vaga ocupada pelo PSB, que estava coligado com o PT) e nesta elegemos seis na conta do chá, sendo a última vaga conquistada na sobra geral dos votos. Por outro lado, naquela tínhamos candidato ao governo, nesta não. Sacrifício feito pelo PT do estado, para consolidar o apoio do PMDB estadual à Dilma.

Daí então a pergunta a ser feita: o que mais influiu no desempenho petista? Foi o desgaste do partido e do governo Lula junto à classe média carioca, a desorganização e a ausência de direção política partidária ou o fato de não termos candidato majoritário ao governo? Num quadro geral em que o partido elegeu a maior bancada na câmara federal, a segunda bancada no senado, e, possivelmente, elegeu mais deputados estaduais no país?

Eu não descarto nenhuma dessas hipóteses, e outras que não me ocorrem neste exato momento, acho até que são complementares, mas não pretendo aquí cometer a leviandade de responder perguntas tão complexas, sem os instrumentos necessários para tais respostas.

Na minha opinião, tais respostas só são possíveis de serem obtidas a partir de uma avaliação criteriosa da condição organizativa do partido. De uma análise sobre os critérios (ou da falta deles) de filiação partidária, cujo o problema maior não é só crescer em proporções geométricas, mas, principalmente, o de não atrair lideranças políticas e sociais para o partido, que envolve também investimento em formação política de dirigentes e da juventude. De um estudo detalhado de como se move os diversos atores políticos e sociais que atuam na política fluminense e sobre o estágio de organização em que se encontram os movimentos sociais do estado, dos quais, ouso afirmar,o PT paulatinamente se afasta - o que não é bom prá eles e muito menos para o partido. Da realização de uma pesquisa que revele como a população do estado vê o PT (suas fortalezas e fragilidades), quais são as proridades políticas e programáticas do estado em suas diferentes regiões - fundamental para subsidiar as administrações municipais petistas e influir nas quais o PT participa da gestão. De posse de tais informações, uma definição de quais os objetivos políticos e programáticos partidários, à luz é claro das intervenções programáticas e em políticas públicas do governo federal, que legitimam a nossa participação nos governos estadual e municipais, a relação do coletivo partidário com as prefeituras administradas pelo partido, enfim, algo só possível de ser realizado, se as direções partidárias deixarem de ser meramente formais, onde interesses específicos e até individuais de correntes e mandatos prevaleçem sobre os coletivos, e se tornem um núcleo dirigente de fato, ou a partir de mediações no interior delas, construam-se tais núcleos dirigentes.

Claro que tantas perguntas complexas não serão respondidas a um só tempo e na velocidade que o partido necessita que sejam respondidas. Além do passivo partidário em relação a tais demandas ser grande, há dificuldades concretas de ordem organizativa e financeira e jamais serão respostas definitivas, pois sempre cotejadas e analisadas à luz de uma coisa chamada conjuntura política, algo dinâmico, mutante e estranho aos debates partidários no estado, fora dos períodos eleitorais. Pelo menos aos que eu conheço ou participei ao longo de mais de dez anos em que fui dirigente estadual do partido.

E isso não é pouca coisa, caso a direção do partido resolva sair da mera formalidade, para cumprir um papel dirigente de fato. Pois uma das coisas que se aprende em qualquer curso de formação, e a experiência vivida ratifica, é que um dos aspectos que determina uma ação política ser mais ou menos exitosa, é uma leitura a mais correta e próxima possível da conjuntura, do contexto político ou do período histórico, em que ela será realizada. Logo, qualquer reunião ordinária de direção, que pretenda fazer juz a tal estatuto, deveria retomar o bom e saudável hábito de promover este debate, de preferência a partir de um texto base. Atualmente, não é isso o que ocorre.

Mas só o fato de promover tal debate e assumir tais preocupações como meta de direção polítca, para mim já é um bom começo. Para dar curso a isso é necessáro o despreendimento e a mobilização dos nossos mandatários de cargos proporcionais e executivos, por conta das estruturas que comandam e da visibilidade e capilaridade social que possuem.

Isso não se restringe ao aspecto eleitoral, mas ao funcionamento regular do partido fora de tais períodos, mas que a eles está ligado e podem potencializá-los. É assim que as figuras públicas do partido com mandato devem comprender tal esforço partidário, não no sentido de invasão da sua autonomia, de controle de suas ações, como prenúncio de danos à reprodução dos seus mandatos.

Desde a quase eleição de Benedita da Silva à Prefeitura do Rio em 1992, não se abre uma possíbilidade tão concreta, para que o partido saia da condição de coadjuvante para a de protagonista no cenário político eleitoral do estado, como a que se apresenta agora, diante do potencial político do senador eleito Lindberg Farias.

Mas para a realização de tal intento, não basta somente uma liderança popular e carismática em ascensão. Há que se construir junto com esta e demais lideranças do partido um projeto - o que se faz ou não se faz agora, certamente repercute mais a frente -, com programa, partido, direção partidária. Um eventual sucesso de tal liderança popular, por si só, não garante que seja acompanhado do fortalecimento e do protagonismo do partido, se as condições para tanto não forem previamente criadas.

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