12/04/2011
Deixou intrigados líderes do PT a crítica do presidente do BNDES, Luciano Coutinho, à condução da política cambial. Ela ocorre num momento de calmaria na relação entre o partido e a equipe econômica, entidades nem sempre regidas pela mesma partitura. Até bem pouco tempo, por exemplo, o PT acusava a Fazenda e o Banco Central de tocar uma nota só no combate à inflação: os juros altos. Hoje é diferente.
A surpresa com a declaração de Coutinho nem é de conteúdo: o PT também acha que algo deve ser feito para deter a queda acentuada do dólar. Mas a percepção partidária é que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, precisa de tempo para avaliar as medidas já tomadas e, se for o caso, lançar mão de outras medidas que tem a seu alcance para deter a apreciação do real.
"Há um forte apoio do partido e da bancada à política econômica implementada pelo ministro Guido Mantega", diz o líder na Câmara, Paulo Teixeira (SP). "Há harmonia entre o Ministério da Fazenda e o Banco Central". Mas - afirma - "a valorização do real é realmente preocupante".
A atual sintonia do PT com Mantega é compreensível. Nunca antes os petistas puderam dizer de peito aberto que executam uma política econômica diferente daquela desenvolvida pelo PSDB, mesmo quando se compara o atual período com a forte aposta do governo Lula no mercado interno para enfrentar a crise financeira mundial.
Mas divisão na equipe de Dilma preocupa partido
O PT sempre sentiu-se desconfortável com o fato de ser acusado pelos adversários de ter mantido a política econômica dos tucanos. O que Mantega fez e vem fazendo é o que sempre pediu o partido, segundo entendem Paulo Teixeira e outros líderes: combater a inflação sem retomar a antiga política monetária, cujo único instrumento seria a alta da taxa de juros altos.
Essa é uma visão comum ao líder Teixeira e seu correspondente no Senado, Humberto Costa (PE); ao líder do governo, Cândido Vaccarezza (SP) e ao presidente da Câmara, Marco Maia (RS), parlamentares de diferentes tendências petistas.
O que para nós é muito importante é que se consiga controlar a inflação sem os custos que nós tivemos no passado", diz Paulo Teixeira. "Portanto, todo esforço de controle da inflação que não envolva aumento de juros - o que retira recursos da área social - é um esforço fundamental", argumenta o líder do PT.
Teixeira foi quem organizou o jantar de Guido Mantega com a bancada do PT na Câmara e no Senado, realizado há cerca de 15 dias, o primeiro de um ciclo de encontros dos deputados petistas com ministros, que deve prosseguir hoje tendo como convidado Alexandre Padilha, da Saúde. É com base nessa reunião e outras conversas com Guido Mantega que Teixeira toma a defesa do ministro na questão cambial criticada por Coutinho.
"Ele [Guido Mantega] vem tomando, desde o ano passado, uma série de medidas para conter a valorização do real", diz o líder do PT. "Agora é fundamental que isso seja devidamente medido para se ver os efeitos". A valorização do real é considerada "preocupante" pelo deputado. Teixeira também acha que a queda acentuada da cotação da moeda americana, neste momento, "exige novas medidas". Mas ele assegura que Mantega está pronto para fazer o que é necessário, no momento certo. Muitas seriam as variáveis em jogo, como o fato de a desvalorização do dólar não ser um fenômeno tupiniquim.
Guido Mantega pode estar mal com parte dos agentes econômicos, mas pelo menos por enquanto está muito bem com a maioria de seu partido. No PT, as pressões sofridas pelo ministro da Fazenda são atribuídas de maneira genérica e recorrente aos bancos. O setor financeiro seria o que mais perde com a atual política. "O Guido aumentou o IOF, aumentou o compulsório e não aumentou os juros", é o bordão.
Segundo petistas, além do entendimento de que o combate à inflação não deve se dar apenas por meio da elevação da taxa de juros, é certo que as medidas de Guido Mantega são adotadas "em absoluta consonância" com a presidente Dilma Rousseff. Nesse contexto, as críticas de Luciano Coutinho, feitas numa reunião com empresários paulistas, semana passada, soam estranhas.
Pior ainda: no convescote com os empresários Coutinho teria citado Aloizio Mercadante (Ciência e Tecnologia) e Fernando Pimentel (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) como outros dois ministros do governo Dilma que pensariam de maneira semelhante. Dois petistas que sempre rezaram na cartilha do desenvolvimentismo.
Coutinho disse ao jornal "Folha de S. Paulo" que sua manifestação na reunião "não foi uma crítica à condução da política cambial". Pode ser. Mas o silêncio de Mercadante e Pimentel deixa evidente que na equipe de Dilma há consenso no atacado, mas também disputa no varejo operacional do combate à inflação. As outras explicações disponíveis no mercado, mas elas não enobrecem o passado de desprendimento dos protagonistas.
A hipótese de uma equipe trincada é tudo o que não precisa a presidente Dilma na fase atual de combate a uma curva inflacionária que teima em se manter ascendente. Em mais de uma ocasião a presidente deixou claro que não quer divergências internas sendo acertadas em praça pública.
O ministro Carlos Lupi (Trabalho), por exemplo, recuou rapidamente da defesa de aumento do salário mínimo bem maior do aquele proposto pelo governo, quando Dilma mandou parar o bate-boca público sobre o assunto. Dias atrás, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, engoliu um desmentido de Mantega sobre o possível aumento do preço da gasolina.
Espera-se, agora, que Dilma adote o mesmo procedimento em relação aos integrantes da equipe econômica, justamente aqueles mais próximos da presidente, que divergem publicamente sobre a condução da política cambial. No partido da presidente, o PT, acredita-se que o governo trava uma batalha com setores poderosos da economia e que o momento não admite divisão: os companheiros devem deixar para aparar mais tarde eventuais diferenças.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
E-mail raymundo.costa@valor.com.br
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