terça-feira, 13 de outubro de 2009

COISAS QUE O GOVERNO LULA PRECISA SUPERAR

Aumenta a concentração da propriedade da terra no Brasil
por Michelle Amaral da Silva última modificação 07/10/2009 12:15
Colaboradores: Editorial ed. 345

07/10/2009

Editorial ed. 345

Na semana passada, o IBGE divulgou com algum atraso, os resultados do Censo Agropecuário relativos a 2006. Os dados são um retrato estatístico da realidade agrária brasileira, medida pela visita dos pesquisadores em todos os estabelecimentos rurais do país, e tomando depoimentos dos seus titulares. A sua publicação ensejou muitos comentários em toda imprensa. E somente com estudos mais apurados e cuidadosos poderemos ter, a partir de agora, inúmeras análises, que possam nos explicar melhor a realidade do meio rural e suas tendências.

Enquanto isso, um olhar sobre as principais tabelas divulgadas já nos permite tirar diversas conclusões, algumas delas apresentadas, inclusive, pelos comentaristas do próprio IBGE, que são de suma importância.

1- A propriedade da terra no Brasil continua se concentrando cada vez mais, comparando os dados do último de censo de 1996 com o atual de 2006. Diminuiu o número de estabelecimentos com menos de 10 hectares. Eles representam os pobres do campo, e eram em 2006 cerca de 2,5 milhões de famílias. A área ocupada por eles baixou de 9,9 milhões de hectares para apenas 7,7 milhões, correspondendo a apenas 2,7% da área total brasileira. No outro lado, temos apenas 31.899 fazendeiros que dominam 48 milhões de hectares em áreas acima de mil hectares. E outros 15.012 fazendeiros com áreas superiores a 2.500 hectares, que totalizam 98 milhões de hectares. São os fazendeiros do agronegócio, que representam menos de 1% dos estabelecimentos, mas controlam 46% de todas as terras.

2 - Esse dado fez com que a concentração da propriedade da terra medida pelo índice de Gini pulasse de 0,852, em 1996, para 0,872 em 2006. Assim, o Brasil ultrapassou o Paraguai, e hoje, certamente, somos o país de maior concentração da propriedade rural.

3 - A produção também se concentrou e se diferenciou. De um lado, a grande propriedade do agronegócio se especializou em produtos para exportação, como soja, milho, cana e pecuária, que dominam a maior parte das terras. Esses três produtos usam 32 milhões de hectares, enquanto os principais alimentos da dieta brasileira usa apenas 7 milhões de hectares para plantar arroz, feijão, mandioca e trigo.

4 - A agricultura capitalista do agronegócio ficou mais dependente do capital financeiro e das empresas transnacionais. O valor bruto da produção agrícola (PIB agrícola) foi de 141 bilhões de reais, em 2006. Destes, 91 bilhões produzidos pelo agronegócio, mas precisou de 80 bilhões de reais de credito rural dos bancos e da poupança nacional para poder produzir. Já a agricultura familiar, produziu 50 bilhões de reais, e utilizou apenas 6 bilhões de reais.

5 - A agricultura familiar produziu comida, e para o mercado interno. O agronegócio produziu commodities, dólares, para o mercado externo. Por isso é dominada pelo controle das grandes empresas transnacionais que controlam o mercado e os preços. As 20 maiores empresas que atuam na agricultura tiveram um PIB de 112 bilhões no ano de 2007. Ou seja, praticamente toda produção do agronegócio é controlada na verdade por apenas 20 grandes empresas. E, em sua maioria, estrangeiras.

6 - O rosto social do povo que vive no meio rural. Há também no censo um retrato da realidade social do meio rural. E a dura realidade emerge nos indicativos de educação. Cerca de 35% de todos os homens adultos e 45% das mulheres, que moram e trabalham no meio rural, não sabem ler e escrever. Apenas 7% da população que mora no meio rural tem o ensino fundamental (8 anos de escola) completos.

Esses dados e outros que não pudemos comentar aqui, por questão de espaço, são reveladores das graves conseqüências desse modelo do capital financeiro e das transnacionais sobre a nossa agricultura, que produziu essa dicotomia entre o modelo do agronegócio e a agricultura familiar. Revela, como as políticas publicas paliativas do Pronaf, Bolsa Família, Luz para Todos, e algum apoio para moradia, são insuficientes para corrigir as graves distorções econômicas e sociais, resultantes da concentração da propriedade da terra e da produção. Daí a atualidade e urgência de uma verdadeira política de reforma agrária, que não seja mais apenas distribuir terras, como o capitalismo industrial clássico fez, mas sim um processo de reestruturação e democratização amplo, do acesso a terra e da reorganização da produção, para abastecimento de alimentos saudáveis, respeitando o meio ambiente, e para o mercado interno. A chamada reforma agrária popular.

Esperamos que o governo e as diversas instituições que atuam no campo, tomem em conta a dramaticidade dos dados, que os movimentos da Via Campesina e as pastorais sociais já vinham denunciando, pois está em curso no Brasil, na verdade, uma contra-reforma agrária, um processo de maior concentração da propriedade e da produção, nas mãos de apenas um por cento de fazendeiros capitalistas, subordinados aos bancos e as empresas transnacionais.

Comentário do Blog

Este blog reconhece o avanço que significa para o país o advento do governo Lula, tanto do ponto de vista do papel que o Brasil exerce no mundo, da retomada da reconstituição do estado brasileiro como planejador, organizador e promotor de desenvolvimento econômico-social e instrumento de distribuição de renda e mobilidade social, quanto no aspecto democrático, que vai da sua relação com os movimentos sociais até o surgimento de novos atores na cena política brasileira.

Este blog se coloca sempre atento ao denunciar os ataques que esse processo histórico, iniciado com a eleição do presidente Lula e com a ascensão do PT e dos seus aliados a uma parcela significativa do poder político no país, é alvo, desferidos pelo conservadorismo e pelas elites políticas e econômicas brasileiras, representadas sobremaneira por parcela da mídia oligárquica e por partidos como o PSDB, DEM e PPS, este hoje uma caricatura, um arremedo, do papel histórico que cumpriu para a organização e emancipação dos trabalhadores brasileiros.

Agora, este blog não se furta de identificar os gargalos próprios do governo Lula, onde há muito se destacam as áreas ambiental e agrária. Menos por limitações ou tibieza dos seus gestores governamentais, não consiste num problema gerencial, mais em função dos poderosos interesses econômicos que envolvem essas áreas, de certa forma representados na sua (do governo Lula) heterogênea base de sustentação, seja do ponto de vista político, seja do ponto de vista social.

Daí, por mais que se entenda que para a aritimética do poder, na correlação de forças presente no país, sejam assimiláveis as alianças táticas ao centro e a centro direita no expectro partidário e social, para reduzir o espaço de movimentação das forças derotadas nas eleições presidenciais de 2002, dados como esses destacados no editorial do jornal Brasil de Fato, revelam a necessidade de não se perder de vista a aposta no crescimento político e eleitoral das forças partidárias e sociais identificadas com o campo democrático e popular, para superação de tais gargalos.

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