domingo, 8 de novembro de 2009

O QUÊ REPRESENTA A ALIANÇA PT-PMDB

Eleições 2010

Diferenças entre essência e aparência*

Flávio Loureiro

A assinatura do pré-compromisso entre o PT e o PMDB deve ser tratada pelo que é, não pelo que parece ser ou pelo que alguns gostariam que fosse. A possível aliança (pois por enquanto estamos diante de um pré-compromisso, com fortes opositores internos no próprio PMDB) é um desdobramento de um dilema político enfrentado pelo governo Lula desde o início de 2003.

Naquela época, ao optar por uma estratégia institucional de governabilidade (descartando a priori lançar mão da mobilização social), o núcleo duro do governo se dividiu entre duas alternativas: ou uma aliança com o PSDB, ou uma aliança com o PMDB.

A maioria daquele núcleo duro defendia uma aliança estratégica com o tucanato. Esta opção comportava uma clara visão programática de condução do país, a favor da qual militavam o ministro da Fazenda Antonio Palocci, o presidente do Banco Central Henrique Meireles, além do ministro Luís Gushiken.

A aliança com o tucanato era um desdobramento lógico das intenções contidas na “Carta aos Brasileiros”, lançada entre o primeiro e o segundo turnos da eleição presidencial, com o objetivo de conter a fuga de capitais do país, estimulada pelo terrorismo político promovido pelo tucanato e pela grande mídia durante a campanha eleitoral, a respeito do significado da eleição de Lula.

Sob este ponto de vista, o PMDB era visto como uma ameaça patrimonialista ao processo de “modernização” do país, modernização iniciada no governo Collor, continuada nos oito anos de FHC e a qual Palocci tentou dar continuidade, através da lógica de ajuste fiscal, contenção de “gastos” públicos e produção de recordes de superávit primário, para remunerar os rentistas e acalmar a banca internacional.

Como resultado da opção preferencial pelo PSDB, o PMDB foi excluído da primeira equipe ministerial, malgrado os esforços feitos pelo então ministro da Casa Civil, José Dirceu, em sentido contrário.

Mas, apesar de derrotada na opção pelo PMDB, a minoria comandada por Dirceu conseguiu bloquear uma aliança formal com o PSDB (opção que tampouco tinha apoios sólidos nas hostes tucanas). Daquele “empate” resultou a aliança com os pequenos partidos de centro-direita, que foi uma das origens da crise de 2005.

Aquela crise resultou no afastamento simultâneo de Gushiken, Palocci, Dirceu e Genoíno. Ou seja, saíram do governo os principais porta-vozes das duas estratégias de governabilidade institucional. Ao mesmo tempo, para salvar o governo e o PT, lançou-se mão de uma grande operação de mobilização social.

Passada a crise e as eleições de 2006, voltou a prevalecer a lógica da governabilidade institucional. Mas, neste momento, estava fora de questão tanto depender do PSDB (que na crise de 2005 demonstrara seu verdadeiro caráter), quanto depender dos pequenos partidos de centro-direita. Resultado: o PMDB foi chamado a compor a base de sustentação do governo.

Curiosamente, o PMDB assumiu destaque no ministério ao mesmo tempo em que o governo Lula faz uma inflexão desenvolvimentista. Esta coincidência nos faz lembrar que o PMDB é caracterizado como atrasado, clientelista e fisiológico; mas não é a sua presença que explica as alianças com o mercado, o grande capital e o agronegócio, opções feitas pelo governo Lula, no seu primeiro estágio, e mantidas em menor escala, no seu estágio atual, pois Meirelles segue no Banco Central.

Logo, eleger a aliança com o PMDB como causa ou manutenção de uma estratégia conservadora ou moderada é simplificar o processo e fugir do verdadeiro debate, que permanece vivo e duro no interior do PT e do governo Lula, acerca de qual será o programa de governo do mandato Dilma.

Neste sentido, é melhor tratar a aliança com o PMDB tal como ela se afigura: eleitoral, principalmente preocupada com o tempo de televisão e com maioria congressual, agora e depois da eleição presidencial de 2010.

A aliança com o PMDB é resultado de uma opção de governabilidade meramente institucional, baseada numa determinada leitura da correlação de forças política ora existente no país e no mundo, apoiada na fragilidade que os episódios de 2005 legaram ao governo, pela virulenta oposição a ele (o governo) perpetrada pelo aparelhos de hegemonia (mídia, partidos, poder judiciário etc.) à disposição do conservadorismo brasileiro.

Diante desta situação, resta ao PT ter a inteligência da razão, para distinguir o que são os seus interesses, os do governo Lula, os do próprio presidente e os que são comuns a ambos, para promover uma política de redução de danos, que passa por defender o seu protagonismo político no processo eleitoral em curso, especialmente lançando candidaturas petistas ao governo de estados importantes, evitando alianças estaduais subalternas com o próprio PMDB. Enfim, fazer o contrário do que tem sido feito.

Flávio Loureiro, Editor do Blog Notícias do PT
*Este artigo foi publicado originalmente na edição de novembro do jornal Página 13)

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