terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

FATOS E VERSÕES DO IV CONGRESSO DO PT

Dirigentes em off
Por Valter Pomar

Foi assim nos três primeiros, está sendo assim de novo: acaba o Congresso, começa o festival de interpretações.

Segundo o jornalista Wilson Tosta (O Estado de S. Paulo, 22 de fevereiro), as emendas aprovadas pelo IV Congresso do PT “colocaram seu programa mais à esquerda”, mas isto teria sido “apenas no plano formal”, até porque a aprovação teria sido possível graças a uma “operação política de bastidores conduzida pelo comando petista”, tudo isto com o aval de Dilma.

Segundo um “dirigente” citado em off, o apoio a medidas como a redução da jornada de trabalho sem redução de salários seria um “doce para as crianças”, um “afago nas correntes do partido”.
Ainda segundo o texto assinado por Wilson Tosta, as “mudanças foram fechadas depois que a maioria dos integrantes da Executiva Nacional reagiu negativamente” ao texto proposto por Marco Aurélio Garcia.

A partir desta suposta reação negativa (que nunca ocorreu, diga-se), teria sido costurada a operação que teria levado à aprovação de tais emendas, que serviriam para dar uma “demonstração inicial” de “autonomia” de Dilma em relação a Lula; bem como serviriam para reafirmar um posicionamento mais à esquerda do PT; mas, ao fim e ao cabo, nada disto seria para valer, pois “o comando do PT e Dilma poderão desprezar o que foi aprovado, alegando que os aliados não aceitam as propostas”.

Como integrante da comissão de programa, que ajudou a elaborar o texto apresentado por Marco Aurélio; como integrante da comissão de emendas, que decidiu o que seria levado a votação; e como delegado ao IV Congresso do Partido, posso dizer que Wilson Tosta comprou e está repassando uma versão falsa dos acontecimentos.

Peço que acompanhem o raciocínio: o segundo mandato de Lula foi melhor do que o primeiro; o primeiro mandato de Dilma será melhor do que o segundo mandato de Lula. No jargão petista, cada mandato está ou estará ”à esquerda” do anterior.

Se isto é verdade, o programa de governo de cada mandato (não apenas as diretrizes, mas o programa) também está ou estará “à esquerda” do anterior.

Mas atenção: o programa de governo não é do PT, o programa de governo é da coligação. Como o PT é um partido de esquerda e a coligação é de centro-esquerda, é óbvio que as diretrizes programáticas petistas estarão à esquerda do programa da coligação.

Óbvio, mas não para alguns “dirigentes” que servem de fonte para jornalistas como Wilson Tosta. Estes “dirigentes” defenderam, o quanto puderam, que as diretrizes de programa deveriam ser “de centro” e não de “esquerda”.

Se tivéssemos aceito isto, o resultado final seria o seguinte: o PT deixaria de ser a ala esquerda da coalizão; e o programa final seria muito mais moderado do que o necessário.

Nem a comissão de programa, nem a executiva nacional, nem o IV Congresso aceitaram esta tese.

Infelizmente, os “dirigentes” que serviram de fonte para Tosta, ao invés de convencer os delegados a não aceitar as 40 horas e a democratização da comunicação social, entre outras emendas aprovadas por unanimidade, preferem dar declarações em off para “reinterpretar” os fatos.

Por fim: além de ser um partido de esquerda, o PT também é o principal partido da coligação. Assim, não é preciso construir teorias conspiratórias para concluir que, se necessário, a direção partidária vai fazer concessões programáticas para construir a coligação.

A boa nova é a seguinte: por mais concessões programáticas que se faça, o programa de governo de Dilma (assim como o programa de governo que Lula apresentou em 2006) continuará melhor e distante, muito distante, dos “preconceitos ideológicos” hegemônicos na Carta aos Brasileiros.

Valter Pomar é membro do Diretório Nacional do PT

Fonte: Site do Jornal Página 13

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