Saia justa
PT critica ação de secretaria do próprio partido
Publicada em 19/11/2010 às 23h42m
Carla Rocha
RIO - Uma pequena reunião no Diretório Estadual do PT deixou numa saia justa o secretário municipal de Habitação, Jorge Bittar. A Coordenadora do Setorial Nacional de Moradia e Reforma Urbana do partido, Cristina Novais, após reunião com cerca de 20 lideranças comunitárias da qual participam militantes petistas, divulgou uma nota de repúdio à forma arbitrária com que estão sendo conduzidas as remoções em áreas de baixa renda da cidade. Titular da pasta, Bittar é um quadro do partido, que apoiou a eleição do prefeito Eduardo Paes. O secretário não foi localizado quarta-feira para comentar o fato.
Procurada, Cristina Novais disse que o grupo já está marcando uma audiência com Bittar para tratar do assunto. Ela afirmou que acredita na possibilidade de uma conciliação das divergências que existem entre os princípios do partido e a política adotada pelo município.
- É uma situação delicada. Porque nós fazemos parte do governo, sabemos das dificuldades que o secretário tem, mas gostaríamos que fossem respeitados os princípios do partido que defende as causas da população mais desfavorecida - afirmou Cristina, que não quis mencionar que ações de remoção serão questionadas junto ao secretário, mas admitiu que acompanhou, por exemplo, o desenrolar das negociações para a desocupação da Vila Taboinhas, na Zona Oeste - uma invasão planejada, que teve início em 2007, em que os moradores chegaram a pagar "luvas" pelos lotes (na época, R$ 500).
A posição do partido foi divulgada no site do PT. Na nota, foram listadas entidades que participaram da reunião, como a Faferj (Federação de Associações de Favelas do Rio), a FAM-RIO (Federação das Associações de Moradores), o Conselho Popular e o Najup (Núcleo de Assistência Jurídica Popular). A mesma nota afirma que também participaram "coordenadores de ocupações, além de técnicos urbanistas".
A nota atribuiu as remoções a megaeventos que serão realizados no Rio, como a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Ainda de acordo com o texto, as iniciativas voltadas para a infraestrutura viária estão sendo pautadas "pela mais absoluta arbitrariedade, falta de transparência, ausência de diálogo e abertura de negociação com as populações envolvidas, violando todos os direitos dos cidadãos".
Fonte: Jornal O Globo, 20/11/10
Comentário do Blog
A despeito de serem ou não procedentes as críticas que a referida reunião petista em epígrafe produziu sobre a gestão de Jorge Bittar, a frente da Secretária Municipal de Habitação da Cidade do Rio de Janeiro, algumas questões merecem análise.
A principal delas serve inclusive ao debate, que ora se trava na direção do partido, sobre a ocupação de cargos no governo Cabral. Pelo jeito, Carlos Minc deve retornar a secretaria de meio ambiente, mas em relação a outra pasta da cota petista, a assistência social, há forte pressão pela substituição do atual secretário, Ricardo Henriques.
A maior crítica a sua gestão não é ténico-administrativa, mas política. Não se relaciona com o partido, nem para a composição da sua pasta, nem para definição das diretrizes políticas de sua ação. Logo, não há desdobramentos políticos para o partido as ações produzidas pela secretaria. Só para o governo do estado, cujo titular, como é do conhecimento público, é de outro partido.
No caso da secretária municipal acontece algo parecido, se relaciona com o partido apenas pelo fato de sua composição técnica e política estar restrita a petistas ligados ao titular da pasta e ao seu setor partiddário, uma espécie de política de porteira fechada, que amiúde dá o tom das indicações petistas aos governos que participa no estado e na prefeitura da capital. Vale ressaltar exceções como na gestão de Benedita da Silva e Carlos Minc, respectivamente, nas secretarias de assistência social e meio ambiente do estado.
Enfim, o cargo executivo, da mesma forma que o mandato proporcional, é do titular, não do partido. Reproduz-se a lógica através da qual viceja a fragmentação interna do PT, nos espaços institucionais onde o partido é convocado a ocupar, mas que os titulares são de antemão escolhidos pelo chefe do poder executivo.
Como não existe uma composição que reflita a pluralidade partidária, tanto nos cargos técnicos quanto nos políticos, a responsabilidade se restringe ao titular da pasta, mas os efeitos políticos de sua ação refletem positiva ou negativamente na imagem do partido, pois o distinto público ignora este tipo de mecanismo petista de composição de cargos públicos.
E sempre retoma o debate sobre a supremacia entre a técnica e a política no composição de tais espaços, e muitas vezes a soberba da técnica cega os efeitos políticos da ação que ela produz, na maioria das vezes só percebidos de forma trágica nos processos eleitorais.
Em função da sua origem e trajetória política, não é difícil decifrar qual é o viés do prefeito Eduardo Paes, quanda trata de planejamento urbano. Mas como o partido disputa tal política de planejamento integrando o governo municipal, se a relação não é partidária, coletiva, se não existe uma relação de pertencimento do partido, não de uma das suas lideranças ou setores, com a secretaria municipal de habitação?
Uma saudável disputa de concepções programáticas e metodológicas sobre planejamento urbano que poderia ser partidária, acaba por ser individual, entre o prefeito e o secretário. Nesses termos não é necessário dizer qual é o lado mais fraco da referida disputa.
sábado, 20 de novembro de 2010
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