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"A candidatura Marina é uma mutação na política brasileira".
Entrevista especial com Luiz Werneck Vianna Marina Silva, ex-ministra do meio ambiente do governo Lula, foi filiada ao PT durante 30 anos. Ontem, ela anunciou sua saída, aumentando a expectativa de sua vinculação ao Partido Verde e sua candidatura à presidência em 2010. A senadora, desde que foi afastada do ministério, estava vivendo uma relação desgastada com o PT, mas, ao anunciar sua saída, diz que quer fazer mais pelo meio ambiente. "Saí do PT para poder ficar livre para negociar com outro partido. Não ficaria bem negociar com um partido estando em outro", disse Marina ontem.
A IHU On-Line conversou com o professor Werneck Vianna, por telefone, sobre a possibilidade de Marina Silva entrar na disputa pela presidência. Segundo ele, "é uma candidatura que vem com muita força, traz novidade, traz o tema da ética de uma maneira forte pela trajetória dela, especialmente, nesse cenário de escândalos políticos".
Vianna também analisou como a candidatura de Marina pode mexer no cenário para o qual as eleições presidenciais se encaminhavam, com Dilma e Serra apenas na disputa. Ao falar sobre as alianças que o presidente Lula tem feito, o professor afirmou que "não se governa o país sem o PMDB", uma vez que é o maior partido do país.
Luiz Jorge Werneck Vianna é graduado em Direito e Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. É mestre em Ciência Política e Sociologia pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro e doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo. Recebeu o título de pós-doutor na Universita Degli Studi di Milano. Ele é professor no IUPERJ. Entre seus livros citamos Esquerda brasileira e tradição republicana: estudos de conjuntura sobre a era FHC-Lula (Rio de Janeiro: Editora Revan, 2006).
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Como o senhor analisa a candidatura de Dilma?
Werneck Vianna - É uma candidatura forte, embora não tenha saído do partido, saiu de uma decisão do Presidente da República, o que é uma dificuldade para ela, pois se fosse uma candidatura do partido ela teria mais força. Mas isso não importa. O prestígio popular que o presidente tem compensa. E ela tem uma trajetória de administradora bem sucedida. Por isso, é uma candidata forte.
IHU On-Line - Qual a novidade na candidatura Marina?
Werneck Vianna - Primeiro, nós precisamos acreditar que ela efetivamente vai ser candidata. Se isso se confirmar, acho que é uma candidatura que vem com muita força, traz novidade, traz o tema da ética de uma maneira forte pela trajetória dela, especialmente, nesse cenário de escândalos políticos. Ela tem uma imagem antipolítica que poderia ajudá-la junto ao eleitorado, isso a favorece. Por outro lado, ela representa um tema de projeção mundial, que é o meio ambiente. Creio que, a partir dos temas do meio ambiente e da ética, ela aparece com força. Eu diria que o potencial dela é imenso. Claro que isso depende do desenvolvimento da sua campanha, da energia que ela está disposta a dedicar a isso. Vejo com uma mutação na política brasileira muito severa, sairíamos de São Paulo, do ABC, do mundo dos sindicatos, da classe operária para o Acre, para Xapuri, para os seringais. É uma mudança política, sociológica e antropológica que, se confirmar a candidatura de Marina, deve marcar muito essa competição eleitoral. Enfim, vejo a candidatura de Marina como de alta relevância do ponto de vista político, sociológico e antropológico, com a transferência do coração político do Brasil e da capital da esquerda do ABC paulista para o Xapuri, no Acre.
IHU On-Line - Como Marina influencia a candidatura de Serra e Ciro?
Werneck Vianna - O Serra pode sofrer "influência" tanto quanto a Dilma. A candidatura da Marina, existindo, desmarca esse quadro e passam a ser três candidaturas e, eventualmente, quatro candidaturas, com a entrada de Ciro. Ou seja, nos aproximamos de uma sucessão presidencial muito competitiva, o que torna tudo bastante imprevisível. Agora, o que o Serra tem, sem dúvida, é o seu Estado lhe fornecendo uma bela base de votos. Quanto mais dividir, mais chance, eu penso, o Serra terá.
IHU On-Line - E quem poderia ser o vice de Marina?
Werneck Vianna - O Cristovam Buarque vai ter dificuldades por causa do PDT. A candidatura de Marina introduz um elemento de descontinuidade da política brasileira muito grande se ela enfrentar com muita energia a sua campanha. Só o deslocamento da "fábrica para a selva", de São Paulo para o Acre, isso é de uma importância imensa. Essas são as questões dominantes. Vamos para uma eleição muito imprevisível, onde as peripécias da campanha podem se tornar decisivas, ao contrário do que se esperava. Esperávamos uma candidatura morna, com dois candidatos previsíveis: a Dilma e o Serra. Agora, há uma reconfiguração da cena. Vamos ver como as organizações internacionais vão olhar essa candidatura, vão analisar o tema da Amazônia, por exemplo.
IHU On-Line - Como o senhor contextualiza a situação ideológica da relação de Marina com o PV?
Werneck Vianna - Ela sempre foi uma "verde". A identidade dela é bem definida, é uma ambientalista, construiu sua vida política em torno dessa questão, no Parlamento ela deu representação a esse tema. Com isso, ela dá ao Verde, pela primeira vez, uma estrutura de partido nacional. O PV, com a Marina empunhando suas bandeiras, vai ser um dos partidos importantes do país. Ele vai criar raiz, vai se nacionalizar. E vão ter que cuidar direitinho do seu programa. Sabemos o que eles pensam a respeito do ambiente, mas o que eles pensam para o desenvolvimento, para o emprego... Fora as fórmulas retóricas do desenvolvimento sustentável, vamos ter que esperar pelos programas e pelos debates.
IHU On-Line - Dentro das relações de força da América Latina, onde podemos situar a candidatura de Marina?
Werneck Vianna - Tudo depende de como ela vai se apresentar. De qualquer modo, Marina não é uma candidata que pode vir pela direita, não é verdade? Ela não tem trajetória, perfil ou programa para isso. Tem a esquerda ambientalista. Mas o tema do ambiente não basta. São necessárias outras perspectivas mais largas, senão fica uma candidatura muito estreita, muito ideológica. Para ganhar tem que ser uma candidatura política, não apenas a expressão de uma ideologia. A vitória de Marina mudará o Brasil e muda as relações do Brasil com o mundo. É um "efeito Obama" muito maior.
IHU On-Line - E o que significa para o PT a saída de Marina?
Werneck Vianna - É uma perda de um quadro importante, de um tema - que vai embora, de certa forma, com Marina. Ela é a maior liderança do PT em relação ao tema meio ambiente. O partido vai ter que enfrentar uma eleição competitiva, coisa que o PT não estava se preparando. Ele preparava-se para uma eleição plebiscitária e não com uma disputa com várias candidaturas. E entre várias candidaturas, a representação do Lula não é tão forte. A própria Marina poderá, na sua campanha, aparecer como uma pessoa vinculada ao Lula. E o Ciro Gomes, se for candidato, também, e por aí vai.
IHU On-Line - Marina é evangélica e se diz contra o aborto. Como essas características implicam em termos sociológicos eleitorais?
Werneck Vianna - Como eu falei, isso é "sair de São Paulo e ir para Xapuri", com a tradição dos seringais, das relações comunitárias. Não é uma candidatura moderna no sentido das atitudes ou dos sistemas de orientação.
IHU On-Line - E nesse sentido, a visão criacionista de Marina explica como seria um projeto de governo dela?
Werneck Vianna - A única coisa que podemos especular é que a candidatura dela desorganiza totalmente o quadro, modifica a posição dos atores e torna a eleição mais competitiva e acirrada do que já era. Não teremos dois candidatos muito parecidos, do ponto de vista de perfil e de programa com Serra e Dilma. Temos que esperar, pois daqui dez dias o cenário pode estar completamente diferente.
IHU On-Line - O que significam as alianças de Lula com Renan Calheiros, Collor e Sarney? A imagem do presidente sai como dessas relações?
Werneck Vianna - Ele é da governabilidade, como sempre sustentou. Imagino que alguma coisa tenha chegado nele, mas parece que continua gozando de altíssima popularidade, mas alguma coisa chegou, certamente. Agora, não se governa o país sem o PMDB, não adianta. É o maior partido. A não ser que partidos que se definam por um programa de mudanças queiram correr o risco da mobilização popular e enfrentar uma trajetória afirmativa nessa direção. O governo Lula não quis isso em nenhum dos mandatos. Ele governou com a política que havia e procurou encontrar estabilidade para realizar seu programa. E alguma coisa realizou.
* Instituto Humanitas Unisinos
sexta-feira, 18 de setembro de 2009
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